quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

A guerra do enriquecimento ilícito


Tiago Cardoso Pinto
Paula Teixeira da Cruz tem nos juizes portugueses os maiores opositores à lei do Enriquecimento Ilícito, que a ministra quer ver em vigor rapidamente. ASJP e DCIA já disseram que a medida é inconstitucional e que há outras formas de lidar com o problema.
“[A lei] Irá ao TC as vezes que for preciso, desiludam-se aqueles que com a arguição de inconstitucionalidade pensam que nos farão desistir do enriquecimento ilícito (…) iremos lá as vezes que forem precisas», afirmou Paula Teixeira da Cruz, durante um almoço-conferência na Universidade Política da JSD/Lisboa, no passado Domingo. A governante apelou ainda ao “envolvimento cívico” pela defesa da criminalização do enriquecimento ilícito.
Mouraz Lopes, presidente da Associação Sindical dos Juizes Portugueses (ASJP), já veio a público mostrar a sua oposição à medida. Na segunda-feira, o magistrado defendeu que os juizes não podem concordar com a lei proposta pela Ministra Paula Teixeira da Cruz, e sugeriu a resolução do problema através de sistema fiscal forte. Para o responsável sindical, esta lei para criminalizar o enriquecimento ilícito pode criar mais problemas do que os que resolve. “As medidas com as quais se quer combater a corrupção passam, nessa matéria, por questões fiscais muito fortes. Essa é uma das soluções”, disse aos jornalistas. “Eu acho que o país tem muitas leis, sobretudo a nível penal, e julgo que não são leis penais que nos faltam”, afirmou ainda.
Mouraz Lopes defende que é necessário “criar um quadro normativo absolutamente compatível com a Constituição, o que não é fácil, como o Tribunal Constitucional já referiu no acórdão a propósito do projecto que foi chumbado.”
Cândida Almeida diz que lei é “inconstitucional”
“Não tenho um pensamento fechado, mas a maneira como foi definido o crime, naquela versão [da lei referida], acho que é inconstitucional”, disse Cândida Almeida durante uma conferência do Clube dos Pensadores, em Vila Nova de Caia, reafirmando que a anterior versão da lei não foi aceite por ser inconstitucional.
Se a ministra da Justiça insistir na criação do crime de enriquecimento ilícito, Cândida Almeida disse que a “comunidade jurídica está aberta a uma descrição do crime que seja aceite” pelo Tribunal Constitucional.
Já em 2009 Cândida Almeida defendia que o enriquecimento ilícito seja considerado crime, mas advertia para a necessidade da constitucionalidade da lei. “Para mim, é essencial que o enriquecimento ilícito seja considerado crime”, afirmou a directora do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), recordando que as duas propostas de criminalização apresentadas té à altura – uma delas do ex-deputado do PS, João Cravinho – foram recusadas por não serem compatíveis com a Constituição da República Portuguesa (CRP). À data, Cândida Almeida afirmou que “humildemente, parece-me que nenhuma delas é inconstitucional”.
Chumbo do TC
Em declarações aos jornalistas após a leitura pública do acórdão do TC, em Abril deste ano, o presidente do Tribunal explicou que se entendeu “que o artigo 1o e o artigo 2°, que eram os artigos que ou introduzindo certos tipos legais ou alterando outras normas introduziam o ilícito, eram contra a Constituição”.
“Primeiro porque não lhe subjazia um bem jurídico claramente determinado, depois porque violava o princípio da lei 7 da determinabilidade do tipo legal e, depois, porque violava o princípio da presunção da inocência”, acrescentou.
Ou seja, resumiu, eram lesados os princípios constitucionais da presunção da inocência e da determinabilidade do tipo legal. Relativamente a este último princípio, o presidente do TC esclareceu que “tem que decorrer de uma incriminação qual é a conduta que é claramente proibida ou qual é a conduta que é ordenada, aquilo com que o agente se deve conformar”.
O presidente do TC adiantou ainda que o Tribunal não se pronunciou quanto ao artigo 10° do diploma, em relação ao qual o Presidente da República tinha requerido a fiscalização preventiva da constitucionalidade, porque era “um artigo axilar”.
Desperdiçar um tribunal do sec.XXI
Paula Teixeira da Cruz sublinhou o “desperdício de dinheiros na construção de Tribunais em locais que não o justificam”, dando como exemplo o palácio da Justiça de Vila Nova de Famalicão.
Aquele edifício possui 4 pisos e um total de 10 salas de audiência, com gravação digital e cabines para tradução simultânea. Salas para testemunhas, gabinetes individuais para magistrados, advogados, de exames médicos e celas, concentrando num único local os juízos cíveis, os criminais, os serviços do MP e o tribunal do trabalho. Vai fechar
Plano Nacional de Reabilitação de Reclusos
A ministra da Justiça, anunciou estar a preparar um “plano nacional de reabilitação” de presos, com formação “desde a carpintaria” às “licenciaturas”, porque “sem isso” continuase apenas a “fazer crescer prisões”. O plano foi anunciado pela governante num almoço-conferência da universidade política da JSD/Lisboa, que decorre em Sintra. “É preciso apostar na ressocialização, se não fizermos nada nem tivermos um plano com várias áreas de reabilitação, as pessoas não terão outra hipótese senão sair das prisões e voltar a fazer o mesmo”, referiu. O secretário-geral da APAR – Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso, Vítor Dharco, disse à Lusa que “se o Ministério da Justiça começa agora a preocupar-se com a reabilitação, só temos a aplaudir”.
Obras nos Tribunais
De acordo com o estado de degradação, 86 tribunais terão a requalificação das instalações até 2014. A Ministra anunciou um orçamento de 29 milhões de euros para estes trabalhos, sublinhando o “desperdício na construção de Tribunais em locais que não o justificam”. Dos 86 tribunais que vão ser alvo de obras, 48 receberão pequenas intervenções e os restantes 38 serão alvo de trabalhos de média e grande monta.
Encerramento sem números
As negociações com as autarquias ainda não terminaram, embora o novo Mapa Judiciário já tenha sido aprovado há duas semanas, em Conselho de Ministros. A Ministra ainda não sabe quantos tribunais encerram, embora garanta que “no final do processo vamos [o ministério] ter uma gestão muito mais flexível, pois vai permitir instalar tribunais quando houver maior procura e desinstalar quando não se justificar”.
O Crime, 13 Dezembro 2012

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