sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Grã-fuga interna

i (sexta-feira, 31 Agosto 2012)
PGR diz desconhecer a notícia
Quase 1500 nomes de maçons do Grande Oriente Lusitano (GOL) estão publicados na blogosfera há mais de quatro semanas.
Líderes do GOL afirmam ao i que o acesso a esses dados é ilegítimo, existindo suspeitas sobre ex-candidatos a grão-mestre. Apesar de a lista dos nomes ter sido publicada por todos os sites de órgãos de comunicação social durante o dia de ontem, a Procuradoria-Geral da República diz não ter “conhecimento oficial” das mesmas
Maçons desconfiam de infiltração no sistema informático
1500 nomes tornados públicos.
“Alguém se infiltrou”, admite António Arnaut
A divulgação de quase 1500 nomes de maçons na internet é caso inédito na história da maçonaria em Portugal. Ex-grão-mestres e maçons do Grande Oriente Lusitano (GOL) contactados pelo i desconfiam de uma infiltração no sistema informático.
“Houve, porventura, uma intrusão e uma infiltração no GOL para ter acesso a dados com objectivos censuráveis”, afirma ao i António Amaut, ex-grão-mestre.
A opinião é partilhada por António Reis, outro ex-grão-mestre do GOL: “Houve alguma intrusão no sistema informático. Há sempre gente que não respeita os outros e as regras e pode ter tido um acesso ilegítimo a dados.”
Vasco Lourenço, capitão de Abril e maçon assumido, acredita que poderá ter sido uma “tentativa de vingança mesquinha”. “A lista é antiga e provavelmente quem a difundiu já não é maçon”, refere.
Arnaut e António Reis também confirmam que a lista “está incompleta”. A lista onde constam 1438 nomes, até à letra M – que inclui políticos, banqueiros, jornalistas, académicos e advogados -, revela a relação entre os maçons e as lojas a que pertencem, mas está desactualizada Nela ainda constam nomes de pessoas que já faleceram há vários anos e “alguns nomes que já não pertencem à maçonaria”, diz um membro do GOL. A divulgação na internet foi feita através de um comentário no blogue “Casa das Aranhas” (ver caixa). O i tentou contactar o actual grão-mestre sem sucesso até ao fecho desta edição.
ACESSO RESTRITO 
Não são todos os maçons que têm acesso à lista com os nomes que pertencem à organização.” Só o grão-mestre”, diz ao i um membro do GOL, lembrando, porém, que na altura das eleições internas todos os candidatos a grão-mestre podem ter acesso aos ficheiros com os membros da organização.
No GOL existe um cofre com documentos secretos como, por exemplo, a “lista negra” dos maçons que foram irradiados.
Um dos princípios desta organização é que nenhum maçon pode revelar o nome de outro.
Em regra, os membros do GOL têm facilmente conhecimento dos “irmãos” que pertencem à , organização. Por exemplo, quando alguém entra para a maçonaria, o seu nome é afixado em todas as lojas para saber se há alguma objecção.
António Reis não tem dúvidas: houve uma “violação da privacidade” com a divulgação desta lista. Já António Arnaut fala em “intromissão condenável na vida interna da maçonaria”, enquanto Vasco Lourenço lembra que “a
Maçonaria também tem pessoas que não deveriam estar lá dentro”. “Não têm perfil”, garante.
“CASA DAS ARANHAS”
Foi no blogue “Casa das Aranhas” que a lista foi divulgada no dia 1 de Agosto, mas só agora veio a terreiro devido a uma notícia da revista “Sábado”. Ao i, o autor do blogue, João Jordão, diz não conhecer a pessoa que divulgou a lista. “Tentei contactá-la através de comentários, mas não obtive resposta”, afirma. O blogue nasceu em 2011. “Sou muçulmano e criei o blogue para tentar educar as pessoas para o assunto do islão, mas entretanto fui falando de outros assuntos”, explica. A lista surgiu num comentário ao post “A Maçonaria Em Portugal – uma História de Corrupção e Conspiração”. S. C.
PGR DESCONHECE 
O i contactou a Procuradoria-Geral da República (PGR) sobre a eventual abertura de um inquérito, mas a PGR respondeu que “não tem conhecimento oficial do teor da notícia” e, portanto, “não se pode pronunciar”.
A lista divulga nomes de vários políticos, incluindo o líder parlamentar do PS, Carlos Zorrinho.
Questionado pelo í, o socialista afirma apenas que sempre tem dito e mantém que “quem desempenha cargos públicos deve fazer um registo de interesses, mas não de crenças e valores”. Opinião diferente tem a vice-presidente da bancada do PSD, Teresa Leal Coelho, que considera que quem desempenha cargos políticos “deve, voluntariamente, fazer um registo de interesses”. Esse é também o entendimento já manifestado publicamente pela ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz.
Com Lilina Valente e Silvia Caneco

A lei é para quem pode

SOL (sexta-feira, 31 Agosto 2012)
Inês Pedrosa
Os países nórdicos tornaram-se referência de esperança quanto à possibilidade de articular a economia capitalista com a protecção dos mais desfavorecidos (o chamado Estado Social) porque conseguiram adestrar as suas elites no cumprimento de regras estritas de transparência e contenção.
Não há, nesses países, especiais mordomias associadas ao exercício de funções públicas. Entende-se que a política é um serviço ã nação e não uma forma de ostentação.
Soube-se agora que, neste ano de austeridade excepcional, os governantes e deputados portugueses receberam um aumento salarial de cerca de 1,5 por cento. Alega o Governo que esse aumento se deve à «atribuição, nos termos da lei, de subsídios de deslocação».
Acontece que ‘a lei’ é algo que deixou de existir para o comum dos portugueses, que têm visto os seus contratos legais desprezados a favor de um suposto ‘bem público’ que extravasa mesmo a lei fundamental. Os subsídios dos trabalhadores Vulgares de lineu’ são para sacrificar; quanto aos senhores, políticos e administradores da coisa pública, a conversa é outra.
A resposta tradicional da ‘gota-de-água’ já não pega: não se trata sequer da poupança efectiva que se obteria através da distribuição equitativa dos sacrifícios, mas do princípio de base. O exemplo do sacrifício tem de vir de cima; de outro modo, os sacrificados enraivecem-se – e a raiva pode ser morna e mansa, porque os lusitanos andam cá há milhares de anos e habituaram-se a sobreviver através da manha e da ronha, mas é sempre um elemento de boicote. Pessoas injustiçadas não produzem mais e melhor: encostam-se às tábuas e torpedeiam pela calada. caso do anúncio do concurso para educadores de infância lançado pelo Centro de Emprego de Tavira, onde alguém acrescentou, no mau português que se segue: «só a admitir a Vera Pereira», é eloquente.
O comunicado do Instituto do Emprego e Formação Profissional, justificando a divulgação da oferta de um emprego cujo candidato afinal já estava escolhido como ‘normal’ e enquadrada nos ‘procedimentos’, teve, no seu absurdo inqualificável, o mérito de fazer ruir a fachada dos ‘concursos públicos’.
Actualmente, a ‘lei’ tornou-se sinónimo do medieval ‘direito de pernada’ dos senhores feudais. E inventam-se ‘leis’ com
nomes sonantes para tapar a impunidade dos incumpridores das leis previamente existentes.
A ‘Lei dos Compromissos’, segundo a qual as câmaras municipais não podem contratar despesa sem terem pago todas as dívidas existentes, é eloquente nos seus resultados: os departamentos camarários que gastaram à tripa-forra vêem as suas dívidas pagas pelos orçamentos dos departamentos cumpridores.
Apuramento de responsabilidades e penalização? Zero. Paga o justo pelo pecador, e está o assunto resolvido. Consequência? O justo sente-se naturalmente estúpido por não ter tido a presciência de ser pecador. É isto promover o bem público?

Moçambique: PR reconduziu Procurador Geral da República para mais um mandato

Diário Digital (sexta-feira, 31 Agosto 2012)
O chefe de Estado moçambicano, Armando Guebuza, reconduziu o juiz Augusto Paulino no cargo de Procurador Geral da República (PGR) para mais um mandato de cinco anos, anunciou a Presidência da República de Moçambique.
Augusto Paulino desempenha a função de PGR desde agosto de 2007, quando substituiu Francisco Madeira, também juiz de carreira.
Uma nota de imprensa do gabinete da presidência da República moçambicana enviada à agência Lusa refere que Armando Guebuza reconduziu Augusto Paulino «tendo decorrido o prazo legalmente estabelecido para o exercício do cargo de Procurador Geral da República».
Diário Digital / Lusa

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

VISTO DE FORA - Como voltar à constitudonalidade

A igualdade é um princípio universal que abrange todos os sacrifícios. Do que o país precisa não é de sacrifícios dos trabalhadores, é de sacrifícios de todos
António Manuel Hespanha
i (quinta-feira, 30 Agosto 2012)
A recente decisão do Tribunal Constitucional (TC) sobre os cortes dos subsídios de funcionários públicos e de reformados tem tido o mérito de trazer cá para fora a sensibilidade constitucional de imensas figuras públicas. Algumas têm formação jurídica e responsabilidades académicas na área. Outras não, e têm invocado isso para estarem mais à vontade ao exprimir opiniões bizarras acerca de como se devia tratar a Constituição em tempos de crise.
Os princípios constitucionais invocados pelo TC são daqueles que existem desde que na Europa se descobriu a ideia de um Estado limitado por uma Constituição. Se – como alguns ignorantes têm sugerido serevisse a Constituição para permitir as medidas legislativas agora invalidadas, do que se trataria era, pura e simplesmente, de despedir a Constituição (já agora… por inadaptação ao posto de trabalho) e entrar num regime de arbítrio, como o do Brunei, a Coreia do Norte, a Arábia Saudita ou o Vaticano (estes últimos, ainda assim, reconhecem limites espirituais à governação).
Senão vejamos que princípios estão em causa Um princípio constitucional atingido teria sido o da violação de direitos adquiridos, afectando o tal princípio da confiança que se deduz logo do art.º 2.º da CRP. É esta norma que consagra a propriedade de cada um, a validade dos contratos livre e legalmente estabelecidos, o direito às prestações públicas concretamente consagradas na lei, a proibição do confisco, a limitação dos impostos ao que está previsto na lei, etc. Enfim, coisas básicas, sem as quais dificilmente se concebe que se possa viver numa sociedade civilizada Que os salários contratados ou as pensões contratadas-e em que os pensionistas até já pagaram a sua parte – sejam direitos adquiridos, é algo que poucos discutem – embora os juristas tendam a discutir tudo – e que os tribunais portugueses têm considerado uma opinião correcta.
Claro que não há direitos absolutos, direitos que não possam ser limitados ou mesmo ignorados em caso de extrema necessidade. Os regimes revolucionários fazem isso; e mesmo muitos outros regimes apenas reformistas ou em situação de extrema necessidade recorrem ao confisco, à denúncia de contratos e tratados, à retenção de pagamentos, ao não pagamento da dívida; como, ainda mais gravemente, recorrem à prisão arbitrária, à vigilância intrusiva e à tortura. Nos últimos anos, países como o Zimbabué, a Venezuela a Argentina, a Islândia – com um generais zado escândalo da opinião dominante, diga-se de passagem… – tomaram medidas extraordinárias do primeiro tipo.
Porém, mesmo que adoptássemos, em tempo de crise, um regime assim permissivo, não estaríamos ainda livres da maçada de uma constituição (ideológica..). Em primeiro lugar, há três coisas que teriam de ser demonstradas sem margem para dúvidas: (i) que a necessidade existe e é tão extrema como a adopção de medidas da gravidade do confisco; (ii) que estas medidas vão resolver o problema; e (iii) que não há outras saídas para a crise. Provar isto cabalmente é muito mais do que repetir ad nauseam e com cara compungida que não há alternativas, que as que se apresentam são delírios ideológicos e que, em contrapartida, se espera e se fará tudo para que o confisco dê resultado, tal como, de resto, já antecipam os mercados e a opinião internacional sobre o país. Dizer isto é o mesmo que não dizer nada.
Mas há mais. Admitindo que se provava tudo isto sem recurso à retórica com honestidade e com rigor, a tal de Constituição ainda tem um outro princípio – o princípio da igualdade -, também ele crucial (talvez ainda mais do que o anterior) e insusceptível de revisão. Se se riscar da Constituição o princípio da igualdade, fica instaurado o arbítrio e desaparece de todo o Estado constitucional. Aqui nem a extrema necessidade vale como escapatória. Pelo contrário, ainda reforça mais a necessidade de, nestes momentos de aperto, todos contribuírem por igual para salvar a comunidade. A salvação de todos exige o sacrificio de todos. Chocantemente inconstitucional à luz de qualquer constituição e imoral à luz de qualquer moral própria de humanos, seria que, para salvar todos, só alguns se sacrificassem. O TC invocou também este princípio da igualdade – os rendimentos do trabalho, público ou privado, devem ser tratados do mesmo modo. Infelizmente, a formulação foi incompleta, demasiado estreita e isso tem permitido uma enorme manipulação da sua discussão.
A igualdade é um princípio universal, que abrange todos os sacrifícios. Do que o país precisa não é de sacrifícios dos trabalhadores (por conta de outrem…), é de sacrifícios de todos. Ou seja, se estamos em guerra, todos têm de contribuir para a guerra de todos. Para isso, a contribuição de guerra tem de ser repartida por todos os rendimentos: salários, lucros de empresas, dividendos distribuídos, remunerações de PPP (declaradas imorais e lesivas do Estado pelo Tribunal de Contas e pelas próprias instituições internacionais financiadoras), ganhos de mais-valias, rendimentos exportados para paraísos fiscais ou para países de regime fiscal mais favorável, activos de grandes fortunas, consumos sumptuários, etc. Para não falar dos proventos da enormidade da fraude fiscal e da florescente economia paralela Ironicamente, é neste grupo dos isentos que seguramente se encontram os maiores responsáveis pela crise: os especuladores, os descapitalizadores da economia real, os exploradores de um Estado corrupto e tomado de assalto pelos interesses, os engenheiros das finanças e da blindagem de direitos suspeitos, os tais administradores de 30 empresas, etc. Estes é que viveram acima das nossas possibilidades e não, como se nos repete todos os dias, “os portugueses”, significando com isto aqueles a quem agora se confiscam salários è pensões. Apesar de uma auditoria independente à dívida ser aparentemente mais temida do que a própria dívida, basta fazer contas, porque os números andam por aí disponíveis em sites oficiais.
Ora desta realização do princípio da igualdade nunca se fala apesar de até já terem surgido propostas legislativas nesse sentido. Oportunisticamente, todos se concentram na formulação restrita do princípio da igualdade que se encontra no acórdão do TC e omitem as consequências de uma formulação geral desse princípio, que englobe todos os rendimentos e não apenas os daqueles que são mais fracos e estão mais à mão. Além de apontar para soluções muito mais justas, esta formulação genérica conduz a soluções economicamente mais razoáveis e mais adequadas ao objectivo de suster a crise.
Sair da constitucionalidade é bastante fácil, sobretudo quando se cobre o país de um fogo cerrado de medos e de ameaças catastróficas, a que o próprio TC sucumbiu em acórdãos anteriores. Mas voltar à constitucionalidade é muito difícil, sobretudo se as soluções ilegítimas foram levianamente dadas como favas contadas. Única vantagem: fazer a prova dos nove quanto à devoção de muitos opinativos pelo núcleo duro de um Estado constitucional.
Todos os oportunistas reduzem tudo à oportunidade. Uma constituição pode convir-lhes muito pouco, mas convém-nos muito a nós todos, os muitos. Professor catedrático de Direito e de História

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Alteração ao Código do Trabalho

Lei n.º 47/2012: Procede à quarta alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, por forma a adequá-lo à Lei n.º 85/2009, de 27 de agosto, que estabelece o regime da escolaridade obrigatória para as crianças e jovens que se encontram em idade escolar e consagra a universalidade da educação pré-escolar para as crianças a partir dos 5 anos de idade

terça-feira, 28 de agosto de 2012

por Lusa, publicado por Ricardo Simões FerreiraHoje
Adriano Moreira defende intervenção do TC no caso RTPO ex-líder do CDS Adriano Moreira defendeu hoje que o Tribunal Constitucional deve ser ouvido no processo de concessão da RTP, sublinhando que esta questão necessita de um "cuidado jurídico extraordinário".
"A constituição não pode ser ultrapassada, ela tem que ser inteiramente respeitada e por isso, volto a insistir, seja qual for a solução, que o Tribunal Constitucional seja ouvido e, por isso, o Presidente da República mande o diploma para ao Tribunal Constitucional", defendeu.
Para Adriano Moreira "vai ser preciso uma perícia e um cuidado jurídico extraordinário" se essa decisão (de concessão da RTP a privados) for tomada.
Adriano Moreira falava aos jornalistas em Castelo de Vide (Portalegre) à margem de uma conferência sobre "Há sinais de esperança num mundo em crise?", uma iniciativa promovida pela Universidade de Verão do PSD, que decorre naquela vila alentejana até domingo.
Para que a operação relativa à estação pública de televisão seja correta e para "ultrapassar as dúvidas constitucionais", Adriano Moreira reiterou que o Tribunal Constitucional tenha que ser "ouvido" e "tenha que decidir sobre o que vier a ser acordado".
Sobre a RTP, Adriano Moreira alertou ainda que a definição do que é o serviço público tem que ser "minuciosa, cuidadosíssima" e que vai "exigir a intervenção de técnicos muito atentos e competentes e com experiência, e talvez não haja essa experiência" em Portugal.
Na quinta-feira passada, o economista e consultor do Governo António Borges considerou, em entrevista à TVI, que a possibilidade de concessionar a RTP1 a investidores privados é um cenário "muito atraente", mas assegurou que nada está ainda decidido sobre o futuro da empresa.
Borges disse que a RTP2 irá "muito provavelmente" fechar, independentemente do cenário a adotar para o futuro da empresa, em razão do seu avultado custo, para reduzidas audiências.
Já na sexta-feira, o Governo admitiu a concessão da RTP1 e o eventual encerramento da RTP2, afirmando que esta decisão permitirá "reduzir os encargos públicos" com a estação de televisão, garantindo em simultâneo a sua "propriedade pública".
Expresso | terça-feira, 28 Agosto 2012
Artigo de Opinião
António Manuel Hespanha – professor universitário, reformado da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa. Continua a ensinar (na Universidade Autónoma, Lisboa) e em outras lides académicas.
A recente decisão do Tribunal Constitucional (TC) sobre os cortes dos subsídios de funcionários públicos e de reformados tem tido o mérito de trazer cá para fora a sensibilidade constitucional de imensas figuras públicas. Algumas têm formação jurídica e responsabilidades académicas na área. Outras não, e têm invocado isso para estarem mais à vontade ao exprimir opiniões bizarras acerca de como de devia tratar a constituição em tempos de crise.
Os princípios constitucionais invocados pelo TC são daqueles que existem desde que na Europa se descobriu a ideia de um Estado limitado por uma Constituição. Se – como alguns ignorantes têm sugerido – se revisse a constituição para permitir as medidas legislativas agora invalidadas, do que se trataria era, pura e simplesmente, de despedir a constituição (já agora … por inadaptação ao posto de trabalho) e entrar num regime de arbítrio, como o do Brunei, a Coreia do Norte, a Arábia Saudita ou o Vaticano (estes últimos, ainda assim, reconhecem limites espirituais à governação).
Senão, vejamos que princípios estão em causa. Um princípio constitucional atingido teria sido o da violação de direitos adquiridos, afetando o tal princípio da confiança que se deduz logo do art. 2º da CRP. É esta norma que consagra a propriedade de cada um, a validade dos contratos livre e legalmente estabelecidos, o direito às prestações públicas concretamente consagradas na lei, a proibição do confisco, a limitação dos impostos ao que está previsto na lei, etc.. Enfim, coisas básicas, sem as quais dificilmente se concebe que se possa viver numa sociedade civilizada. Que os salários contratados ou as pensões contratadas – e em que os pensionistas até já pagaram a sua parte – sejam direitos adquiridos é algo que poucos discutem – embora os juristas tendam a discutir tudo  – , e que os tribunais portugueses têm considerado uma opinião correta.
Claro que não há direitos absolutos, direitos que não possam ser limitados ou mesmo ignorados em caso de extrema necessidade. Os regimes revolucionários fazem isso; e mesmo muitos outros regimes apenas reformistas ou em situação de extrema necessidade, recorrem ao confisco, à denúncia de contratos e tratados, à retenção de pagamentos, ao não pagamento da dívida; como, ainda mais gravemente, recorrem à prisão arbitrária, à vigilância intrusiva e à tortura. Nos últimos anos, países como o Zimbabué, a Venezuela, a Argentina, a Islândia – com um generalizado escândalo da opinião dominante, diga-se de passagem … – tomaram medidas extraordinárias do primeiro tipo.
Porém, mesmo que adotássemos, em tempo de crise, um regime assim permissivo, não estaríamos ainda livres da maçada de uma constituição (ideológica …). Em primeiro lugar, há três coisas que teriam que ser demonstradas sem margem para dúvidas: (i) que a necessidade existe e é tão extrema como a adoção de medidas da gravidade do confisco; (ii) que estas medidas vão resolver o problema; e (iii) que não há outras saídas para a crise. Provar isto cabalmente é muito mais do que repetir ad nauseam e com cara compungida que não há alternativas, que as que se apresentam são delírios ideológicos e que, em contrapartida, se espera e se fará tudo para que o confisco dê resultado, tal como de resto já antecipam os mercados e a opinião internacional sobre o país. Dizer isto é o mesmo que não dizer nada.
Mas há mais. Admitindo que se provava tudo isto sem recurso à retórica, com honestidade e com rigor, a tal de Constituição ainda tem um outro princípio – o princípio da igualdade -, também ele crucial (talvez ainda mais do que o anterior) e insuscetível de revisão. Se se riscar da Constituição o princípio da igualdade, fica instaurado o arbítrio e desaparece de todo o Estado constitucional. Aqui, nem a extrema necessidade vale como escapatória. Pelo contrário, ainda reforça mais a necessidade de, nestes momentos de aperto, todos contribuírem por igual para salvar a comunidade. A salvação de todos exige o sacrifício de todos. Chocantemente inconstitucional, à luz de qualquer constituição, e imoral, à luz de qualquer moral própria de humanos, seria que, para salvar todos, só alguns se sacrificassem. O TC invocou também este princípio da igualdade – os rendimentos do trabalho, público ou privado, devem ser tratados do mesmo modo. Infelizmente, a formulação foi incompleta, demasiado estreita, e isso tem permitido uma enorme manipulação da sua discussão.
A igualdade é um princípio universal, que abrange todos os sacrifícios. Do que o país precisa, não é de sacrifícios dos trabalhadores (por conta de outrem …), é de sacrifícios de todos. Ou seja, se estamos em guerra, todos têm que contribuir para a guerra de todos. Para isso, a contribuição de guerra tem que ser repartida por todos os rendimentos: salários, lucros de empresas, dividendos distribuídos, remunerações de PPPs (declaradas imorais e lesivas do Estado pelo e pelas próprias instituições internacionais financiadoras), ganhos de mais-valias, rendimentos exportados para paraísos fiscais ou para países de regime fiscal mais favorável, ativos de grandes fortunas, consumos sumptuários, etc.. Para não falar dos proventos da enormidade da fraude fiscal e da florescente economia paralela.
Ora desta realização do princípio da igualdade nunca se fala, apesar de até já terem surgido propostas legislativas nesse sentido. Oportunisticamente, todos se concentram na formulação restrita do princípio da igualdade que se encontra no acórdão do TC, e omitem as consequências de uma formulação geral desse princípio, que englobe todos os rendimentos e não apenas os daqueles que são mais fracos e que estão mais à mão. Além de apontar para soluções muito mais justas, esta formulação genérica conduz a soluções economicamente mais razoáveis e mais adequadas ao objetivo de suster a crise.
Sair da constitucionalidade é bastante fácil, sobretudo quando se cobre o país de um fogo cerrado de medos e de ameaças catastróficas, a que o próprio TC sucumbiu em acórdãos anteriores. Mas voltar à constitucionalidade é muito difícil, sobretudo se as soluções ilegítimas foram levianamente dadas como favas contadas. Única vantagem: fazer a prova dos nove quanto à devoção de muitos opinativos pelo núcleo duro de um Estado constitucional. Todos os oportunistas reduzem tudo à oportunidade. Uma constituição pode-lhes convir muito pouco, mas convém-nos muito a nós todos, os muitos.

Prestigiar a justiça para defender a Constituição

Por António Cluny, publicado em 28 Ago 2012 
Se nenhuma reforma é politicamente neutra, no actual contexto não parece possível, também, conferir eficácia e legitimidade à justiça sem mudanças significativas
1. Depois do que se tem dito sobre a influência do associativismo judiciário – e têm-se dito muitos disparates –, convém ler os importantes documentos que a Associação Sindical dos Juízes e o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público recentemente divulgaram sobre as reformas.
Concorde-se ou não com a generalidade das suas observações, certo é que ninguém pode negar empenhamento, profundidade, honestidade e utilidade a tais estudos.
Eles alertam para problemas importantes, sugerem soluções viáveis para a melhoria do sistema de justiça e contribuem, com rigor científico e sem demagogia, para um debate político e cívico que é preciso travar.
Uma intervenção desta natureza só prestigia a forma como o associativismo judiciário português soube renovar-se, reinventando, nas circunstâncias de hoje, as suas melhores tradições.
2. Essa intervenção evidenciou, além disso, uma característica imprescindível a este debate.
Desvendou, de novo, os termos correctos em que deve situar-se a discussão política em torno dos problemas da justiça.
Quem pôde acompanhar as reformas que moldaram a justiça portuguesa da democracia é capaz de recordar como até finais dos anos 80, início dos anos 90, tal discussão era situada por todos os intervenientes políticos e sociais – dentro e fora do parlamento – num espaço e num tom bem diferentes daqueles usados em outras áreas da política.
Não por acaso, apesar da vigorosa conflitualidade política e ideológica de então, tais reformas obtinham, nesse período, contributos de diversas origens, numa consensualidade rara e exemplar.
Foi só após o surgimento de alguns processos judiciais invulgares no panorama político-judiciário português que esse modelo foi rompido por quem, na «política» e por vezes fora dela, representava os interesses ameaçados.
Ainda hoje, perante a recente e polémica decisão do Tribunal Constitucional, houve quem não resistisse a percorrer esses caminhos.
Os prejuízos dessa estratégia para o prestígio e a autoridade da justiça foram, porém, notórios.
Se foi esse também o resultado pretendido, então temos de reconhecer que o sucesso foi total.
3. Reconstruir a eficácia e a autoridade da justiça exige, de facto, de todos os agentes políticos e sociais um debate especialmente orientado por uma lógica própria de intervenção democrática.
Se nenhuma reforma é politicamente neutra, no actual contexto não parece possível, também, conferir eficácia e legitimidade à justiça sem mudanças significativas.
A necessidade de a democracia retornar a um discurso baseado no direito, um discurso escudado na genuinidade dos princípios constitucionais e capaz de se afirmar, de novo, como um sustentáculo da esperança colectiva na realização do bem comum, exige inevitavelmente um esforço de todos para a credibilização da justiça.
A discussão a encetar deve, assim, ter sempre em conta a preocupação de recolocar os tribunais no plano institucional que lhes compete. Só assim eles podem constituir um baluarte socialmente eficaz da lei fundamental.
Importa, por isso, erradicar todo o tipo de facciosismos fáceis, estudar profundamente as matérias em causa, discutir os problemas reais e encontrar soluções consensuais (constitucionais) para problemas comummente reconhecidos.
A defesa do Estado de direito e da Constituição – enfim, da soberania nacional – perante a univocidade e a prepotência do discurso das «exigências dos mercados» tem, também, de passar por aí: pela eficácia e pelo prestígio da justiça.
Jurista e presidente da MEDEL

domingo, 26 de agosto de 2012

Judiciária investiga Polícia Municipal de Vila do Conde

ANTÓNIOSOARES E NUNO SILVA
Os infratores justificam-se com a condição de funcionários da Câmara
Judiciária investiga Polícia Municipal de Vila do CondeA Polícia Judiciária do Porto tem em curso uma investigação à Polícia Municipal de Vila do Conde, na sequência de uma denúncia anónima de alegados perdões de multas autorizados pela chefia.
A maioria das situações em análise, apurou o JN, diz respeito a contraordenações por estacionamentos indevidos em parquímetros, em passeios e em linhas amarelas, entre outras zonas proibidas. Em alguns dos autos que acabaram por ser anulados, os infratores justificam-se com a condição de funcionários da Câmara e de não terem tido outras alternativas de estacionamento.
Mas, naqueles requerimentos, há também quem se limite a dizer que cometeu a infração por distração e quem apenas coloque o nome e cargo que ocupa, na Autarquia e noutras instituições da cidade. Os despachos favoráveis de anulação têm assinatura de uma pessoa ligada à hierarquia da Polícia Municipal.
Ler mais na versão e-paper ou na edição impressa.

Responsabilidade desportiva

Sentir o Direito
Por: Fernanda Palma, Professora Catedrática de Direito Penal
Entre a responsabilidade desportiva e a responsabilidade penal existe uma fronteira qualitativa que, por vezes, se revela imprecisa. Os comportamentos adotados pelos atores desportivos no decurso das provas ou em seu redor atingem, com frequência, um nível de veemência física que invade o espaço de liberdade e segurança dos adversários.
A responsabilidade penal começa quando uma prática não se configura como mera violação das regras desportivas, por ser grosseiramente lesiva e inadequada. Por exemplo, no pugilismo, os murros na nuca são proibidos, mas não implicam, em regra, responsabilidade penal. Mas uma dentada na orelha (como foi dada por Tyson a Holyfield) já é ofensa corporal.
É certo que o Código Penal não traça a fronteira entre condutas aceites outoleradas na atividade desportiva (ainda que violadoras das regras do jogo) e comportamentos que devem ser considerados ofensas corporais, à partida simples, puníveis com prisão até três anos mediante queixa. Têm de ser asrepresentações sociais a fornecer esses critérios de adequação.
Um critério possível atende ao conjunto de condições de que depende a prática desportiva. Se no futebol, por exemplo, se considerasse ofensa corporal o vulgar empurrão ou a rasteira, tornar-se-ia inviável o próprio jogo tal como hoje o conhecemos. Só haverá aí ilícito desportivo. Mas nada impede a intervenção do Direito Penal se um jogador esmurrar outro.
As ofensas corporais são pois delimitadas, naqueles desportos que se praticam através de jogos ou lutas, por critérios de adequação social que abrangem não só as práticas permitidas pelas regras do jogo, mas também aquelas que estão próximas e representam riscos típicos da atividade desportiva. Trata-se de riscos que os intervenientes aceitam presumivelmente.
Uma questão que foi suscitada pelo recente caso de Luisão é se, no relacionamento entre atletas e árbitros, valem também certos critérios de adequação. Embora a margem de tolerância seja menor do que na relação entre atletas em competição, a resposta é positiva. Há casos em que a responsabilidade pode ser restringida ao plano puramente disciplinar.
A existência de dolo (ofensa ‘voluntária’) ou negligência grosseira, a gravidade da ofensa e os motivos e fins do agente, no contexto da situação concreta do jogo, são elementos de que depende a afirmação da responsabilidade penal. No caso de esta existir, será cumulável com a responsabilidade disciplinar, por ter sido praticada uma infração desportiva.

sábado, 25 de agosto de 2012

Novo tribunal imposto pela troika já está entupido

Expresso (sábado, 25 Agosto 2012)
RUI GUSTAVO
Juizes e advogados criticam Tribunal de Propriedade Intelectual, que só tem uma juíza para casos de todo o país. A magistrada lembra que já proferiu 283 despachos
A funcionar desde o final de março, por imposição da troika, o Tribunal de Propriedade Intelectual está entupido e incapaz de resolver os processos que tem em mãos. É o que conclui um estudo da Associação Sindical de Juizes: “Um tribunal instalado há apenas quatro meses está já a a acumular pendências e a ser alvo de críticas de todos os interessados.”
Um exemplo: “No início de julho, pusemos uma providência cautelar para impedir que as discotecas e bares que só abrem no verão passassem música sem pagar direitos. Ainda não tivemos uma decisão e daqui a duas semanas as discotecas vão fechar”, conta Miguel Carretas, presidente da Audiogest, associação que promove o pagamento de direitos de autor por parte de bares e discotecas que passam música e que concentra a maior dos processos que entram neste tribunal. “Segundo sabemos, o tribunal ainda não fez um único julgamento”, espanta-se o mesmo responsável. “É um tribunal de opereta, um cenário criado para agradar à troika.”
Através do porta-voz do Conselho Superior de Magistratura, a única juíza do tribunal, Maria Fonseca, explica que esteve em acumulação de funções no Tribunal de Loures, “com vários processos complexos” a seu cargo e garante que finalizou, “24 ações ordinárias, 8 procedimentos cautelares e 6 recursos de marca”.
No total, garante a juíza, numa resposta enviada por escrito, “foram proferidos 283 despachos”.
E se há demora na resolução dos casos é porque a “Audiogest não junta prova testemunhal e documental”, ou fá-lo “tardiamente”, “atrasando e perturbando o normal andamento dos processos”. “Houve, de facto, uma audiência de uma providência cautelar, mas foi realizada e a decisão foi também proferida por um juiz de turno”, insiste Miguel Carretas.
E a associação dos juizes considera “displicente” e “irresponsável” a maneira como o “poder executivo” está a lidar com este tribunal, considerado essencial para o desenvolvimento económico e para atrair investimento estrangeiro (ver P&R).
“Foi um erro grosseiro ter inaugurado o tribunal sem fazer qualquer estudo prévio”, critica Maria José Costeira, juíza no Tribunal de Comércio e especialista em propriedade intelectual. “Em quatro meses, não houve qualquer decisão de mérito (final) e só houve uma dúzia de casos resolvidos porque as partes chegaram a acordo ou houve desistências”, precisa. “E não faz qualquer sentido que só haja um tribunal em Lisboa, quando grande parte das empresas que recorrem ao tribunal são do Norte”, continua ajuíza.
Um juiz chega?
Entre 31 de março e 20 de julho deste ano, deram entrada no tribunal 244 processos, que estão nas mãos de uma juíza. A lei previa dois juizes, mas em setembro a atual juíza vai ser substituída por outra e o tribunal vai continuar com um único juiz para todos os processos, número considerado insuficiente por todos os profissionais do sector.
“Começou tudo mal”, acusa Manuel Lopes Rocha, advogado que escreveu um livro sobre este tribunal, a ser publicado em setembro. “Não há país nenhum do mundo que tenha só um tribunal destes. Há secções especializadas nos tribunais comuns e é assim que deve ser, porque não faz nenhum sentido que uma pessoa de Viana do Castelo tenha de vir a Lisboa para resolver um problema com uma marca, ou qualquer outra coisa. Na Turquia começaram com um tribunal e já vão em cinco”, diz o mesmo advogado.
Grande parte dos processos que chegam a este tribunal está relacionada com pirataria e uso indevido de programas informáticos. Luís Sousa, da Assoft, admite que achou “boa ideia” a criação de um tribunal especializado, mas está desiludido com a realidade. “As coisas não andam, um magistrado é manifestamente pouco. Há poucas decisões, e as que existem não têm muita lógica.” Por exemplo: “Se uma empresa compra a um dos nossos associados 50 programas e depois tem 100 utilizadores, é evidente que há utilização abusiva. Dantes, quando levávamos uma questão destas ao tribunal, o juiz concedia-nos uma providência cautelar, sem ouvir a parte contrária, porque as provas informáticas apagam-se com muita facilidade. Mas esta juíza insistiu em ouvir a parte contrária num processo e teve de ser o Tribunal da Relação a dar-nos razão.”
O Ministério da Justiça, numa curta resposta enviada por escrito, garante estar “a acompanhar, com particular atenção”, a atividade do tribunal, “pelo que serão adotadas todas as medidas que vierem a considerar-se adequadas no decurso desse processo de avaliação”.

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Há menos 95 mil bagatelas penais

Correio Manhã (sexta-feira, 24 Agosto 2012)
JUSTIÇA - 63 MIL PROCESSOS ESTAVAM PARADOS HÁ OITO ANOS
Compromisso com a troika prevê acabar com a pendência processual no segundo trimestre de 2013. Esforço dos tribunais já eliminou 95 mil acções
MANUELA GUERREIRO
Parece uma gota no imenso oceano dos processos pendentes em tribunal, mas representa uma grande conquista: em apenas nove meses os tribunais eliminaram 95 mi 1 processos de execução, as chamadas ‘bagatelas penais’, que envolvem pequenos valores, mas que são responsáveis pelo entupimento dos tribunais.
Um esforço no âmbito dos compromissos assumidos pela troika e que levou o Ministério da Justiça a formar um grupo de trabalho que tem a missão de identificar os estrangulamentos. O grupo foi criado em Novembro de 2011 e já passou à lupa 300 mil processos, tendo eliminado 95 mil. Destes, 63 mil estavam pendentes há mais de 2840 dias, quase 8 anos.
Segundo fonte do Ministério da Justiça, “foram identificadas vários estrangulamentos, sobretudo de foro informático, que impediam a comunicação entre as várias fases do processo executivo”.
A 1 de Janeiro deste ano, recorde-se, os tribunais tinham pendentes 1,7 milhões de processos, a maioria correspondente a acções executivas relacionadas com pequenas dívidas.
Para acabar com este massacre processual, o Ministério da Justiça realizou uma auditoria aos casos pendentes e identificou 40 tribunais que concentram o maior volume de trabalho. A 1 de Janeiro, estes 40 tribunais totalizavam 617 302 processos. O campeão está em Lisboa. Sem reforço de meios, mas com uma nova forma de organização de trabalho, foi criada, em Maio, uma equipa especializada nos Juízos de Execução de Lisboa, tribunal com maior número de execuções, para dar prioridade às pendências, sobretudo as de montante inferior a 1000 euros.
A mesma ideia já foi implementada no Porto. De acordo com o memorando de entendimento celebrado com a troika, Portugal tem de eliminar as pendências até ao segundo trimestre de 2013.
Mais juízes para Lisboa e Porto já em Setembro
Para acelerar a eliminação do número de processos e cumprir o memorando de entendimento assinado com a troika, os juízos de execução de Lisboa e do Porto, que lidam com o maior número de execuções, vão ter um reforço de juizes já em Setembro, segundo apurou o CM.
Neste momento, o tribunal de Lisboa tem nove juizes para 270 mil acções. No âmbito da reforma do Mapa Judiciário, o Conselho Superior da Magistratura propõe que o tribunal de Lisboa passe a ter 12 juízes.

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

O Estado que não emagrece

Sábado (quinta-feira, 23 Agosto 2012)
O Governo quer convencer os portugueses de que é quase a mesma coisa cortar dois subsídios aos funcionários públicos ou um subsídio a toda a gente – público e privado. Infelizmente, não é.
Se, num caso, o Estado poupa nas despesas e corta o que gasta com um sector grande demais e caro demais (custou 19,3 mil milhões de euros só em salários no ano passado); no outro caso, aumenta as receitas e faz o que sempre soube fazer quando falta dinheiro: sobe os impostos.
Esta diferença entre cortar a despesa e aumentar a receita não é apenas a diferença entre uma medida justa e necessária para a sobrevivência do Estado e outra injusta e fatal para o emagrecimento do sector público. É, acima de tudo, um erro político e uma violação do acordo com a troika.
Portugal chegou à situação em que está porque o Estado gasta demais. Distribui cargos na função pública sempre que muda o partido no poder, aumenta salários cada vez que há eleições e recusa-se a avançar com despedimentos com medo de perder votos.
O Estado é o único sector da economia que não dispensa trabalhadores quando está em dificuldades financeiras. É o único patrão que não exige mais trabalho quando é preciso produzir mais. É o único empregador que não corta salários quando se acaba o dinheiro.
O Estado engordou enquanto as empresas emagreceram e recusa-se a fazer dieta quando o país praticamente passa fome – por exemplo, na Madeira, o número de funcionários públicos deveria cair 2% ao longo deste ano e até agora caiu 0,7%. Enquanto os portugueses poupam, o Estado manteve o número de municípios, recuou no corte de freguesias, hesitou na mobilidade dos funcionários públicos, adiou a redução das fundações, amedrontou-se na renegociação das rendas energéticas e das PPP e prepara-se agora para abandonar a diminuição de salários com a desculpa do Tribunal Constitucional. Nas medidas da troika para poupar, o Estado vacilou; nas medidas para cobrar, o Estado superou-se. Substituir o corte dos subsídios da função pública (despesa) por uma sobretaxa para todos (receita) é fazer o que sempre foi feito: os seus impostos pagam os excessos dos governos.
NA COREIA DO NORTE, Kim Jong-Il escolheu o seu sucessor, o filho Kim Jong-Un; em Cuba, Fidel Castro escolheu o seu sucessor, o irmão Raul Castro; na Síria, Hafez al-Assad escolheu o seu sucessor, o herdeiro Bashar al-Assad; e no Bloco de Esquerda Francisco Louçã também escolheu os seus sucessores, os amigos João Semedo e Catarina Martins, além de um novo modelo de liderança bicéfalo.
É claro que nada disto tem qualquer resquício ditatorial. Todos eles tiveram de passar por rigorosas e exigentes eleições típicas de uma livre democracia de extrema-esquerda: tal como Kim Jong-Un foi eleito pela Assembleia Popular Suprema, Raul Castro pela Assembleia Nacional de Cuba e Bashar al-Assad pela Assembleia do Povo, também João Semedo e Catarina Martins terão de ser aprovados pela convenção do Bloco de Esquerda.
Mas, se houvesse qualquer dúvida sobre o sentido de voto dos militantes, Francisco Louçã fez logo questão de esclarecer que esta sua sugestão teve uma “enorme simpatia dentro do núcleo da direcção do Bloco” e que “só há razões para presumir que será muito bem aceite” pela convenção do partido. Perante isto,
no caso português se calhar não valeria a pena sequer insistir com a votação formal: Louçã já tomou a decisão, o partido só precisa de obedecer.
O DIÁRIO DE NOTÍCIAS cometeu a ousadia de perguntar ao gabinete de Pedro Passos Coelho se o senhor primeiro-ministro se dera ao cuidado de pedir factura do aluguer da sua casa no Algarve. Visto que o aluguer sazonal de habitações de Verão é uma das formas habituais de fuga ao fisco, o DN achou a pergunta pertinente. Mas Pedro Passos Coelho considerou-a uma evidente violação do “foro privado”, porque “não estão em causa dinheiros públicos”.
Da próxima vez que um inspector das finanças lhe perguntar se negociou as obras de casa ou o arranjo do carro sem factura e sem IVA, já sabe o que deve responder.

MP pede ajuda a ministros para descobrir documentos

Jornal Notícias (quinta-feira, 23 Agosto 2012)
CASO SUBMARINOS
DCIAP admite falta de “dossiê histórico” e quer Aguiar Branco e Portas a colaborar
Nuno Silva
O DEPARTAMENTO Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) anunciou, ontem, que vai fazer “novas diligências” para tentar encontrar a documentação desaparecida no processo de compra e venda dos dois submarinos alemães pelo Estado. Nesse sentido, irá pedir a colaboração de José Aguiar Branco, ministro da Defesa, e de Paulo Portas, enquanto titular daquela pasta na altura da celebração do contrato.
Em comunicado, o DCIAP explica que, entre 21 de abril de 2008 e 13 de novembro de 2009, foram analisados documentos dispersos por diversos departamentos do Ministério da Defesa e arquivos, com a “total colaboração e disponibilidade” dos ministros da altura. E que fez diligências de “busca e apreensão em diversos locais”.
Contudo, frisa a nota, “continua a faltar o ‘dossiê’ histórico contendo a documentação relativa aos concursos que antecederam a celebração dos contratos, contrapartidas e financiamentos”.
Como o JN revelou na edição do passado dia 11, o desaparecimento dos documentos foi referido pelo procurador João Ramos, do DCIAP, num despacho de 4 de junho, ao arquivar o inquérito em que era visado apenas o arguido e advogado Bernardo Ayala. O processo principal continua sob investigação.
No comunicado, o DCIAP acrescenta que o processo emque se investigam eventuais crimes de corrupção, tráfico de influência e prevaricação – “prossegue os seus termos, aguardando-se resposta a diversas cartas rogatórias emitidas para vários países”.
PRIMEIRAS REAÇÕES
  • Aguiar Branco
Em 13 de agosto, referiu não ter ainda recebido qualquer solicitação do MP, mas manifestou-se “totalmente colaborante”, pedindo à PGR que diga quais são os documentos em falta.
  • Paulo Portas
Já afirmou estar “disponível para qualquer esclarecimento” e ironizou que as notícias “emergem quando convém e submergem quando deixa de interessar”.
  • Augusto Santos Silva
Outro antigo ministro da Defesa já garantira que, enquanto no Governo, respondeu a todos os pedidos de documentação feitos pelo Ministério Público.
  • Severiano Teixeira
“Durante o meu mandato como ministro da Defesa (…) todas as solicitações que o MP fez foram positivamente respondidas”, disse há dias.

Parecer da PGR aponta para inconstitucionalidade na regulamentação da Lei dos Compromissos

Público (quinta-feira, 23 Agosto 2012)
Justiça
Mariana Oliveira e Margarida Gomes
Procurador-geral vai pedir fiscalização ao Tribunal Constitucional, mas processo ainda não foi entregue
Um parecer pedido pelo procurador-geral da República, Pinto Monteiro, ao representante do Ministério Público no Tribunal Constitucional (TC), aponta para a eventual inconstitucionalidade na regulamentação da Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso, muito contestada pelos autarcas. Por isso, Pinto Monteiro vai pedir a declaração de inconstitucionalidade de algumas normas, um processo que ainda não deu entrada naquele tribunal.
“Sendo o parecer no sentido de existir eventual inconstitucionalidade, o procurador-geral da República determinou que fosse pedida a declaração da mesma”, adianta a Procuradoria-Geral da República numa resposta enviada ao PÚBLICO. O assessor de imprensa do TC, Pedro Moreno, informa que o pedido ainda não deu entrada naqueles serviços e que, como se trata de um caso de fiscalização sucessiva (posterior à entrada em vigor das normas), o processo não corre durante as férias judiciais, que apenas terminam no fim do mês.
A decisão de Pinto Monteiro ocorre depois de a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) se ter reunido com o procurador-geral, pedindo-lhe que solicitasse a inconstitucionalidade de alguns artigos na regulamentação da Lei dos Compromissos. Antes de pedir a intervenção da PGR, a própria associação de municípios pediu um parecer sobre a inconstitucionalidade da regulamentação da lei. Embora a ANMP considere que o decreto-lei regulamentar da Lei dos Compromissos “tenha melhorado muito o entendimento da lei, atenuando os seus efeitos negativos”, por outro lado “regulamenta aquilo que não está na lei e é isso que viola a Constituição”
Artur Trindade, secretário-geral da associação de municípios, disse ontem ao PÚBLICO que a ANMP “não anda à procura de argumentos que justifiquem a inconstitucionalidade do decreto lei regulamentar”, até porque – sustenta – “o Tribunal Constitucional pode considerar que nós não temos razão”. “É por isso que sobre essa matéria não quero dizer mais nada. Ficamos à espera que o Tribunal Constitucional se pronuncie.” De resto, Artur Trindade voltou a vincar que “a Lei dos Compromissos é uma lei absurda e que isso já foi politicamente assumido pela ANMP”. A grande questão tem a ver com a definição do conceito de “dirigente”, que os autarcas entendem violar a Constituição, porque, justificam: “Nós somos eleitos políticos, não somos gerentes municipais. Não somos funcionários da administração pública.”

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

O excesso de advogados, as quotas de 37 euros e o El Dorado dos grandes escritórios

Expresso OnLine (quarta-feira, 22 Agosto 2012)
Em 20 anos os advogados quase triplicaram em Portugal. Hoje são quase 30 mil. Foi uma subida que aproveitou a muita gente dentro do sistema mas que prejudicou a esmagadora maioria dos advogados. Sobretudo os jovens profissionais que engrossaram nos últimos anos as fileiras da Ordem dos Advogados.
As Universidades Privadas ( mas também as Públicas) ganharam muito dinheiro com as propinas nos cursos de Direito anos a fio
As grandes sociedades de advogados fizeram muito melhor a triagem para admitir os melhores jovens advogados no meio das sucessivas fornadas saídas das Universidades, pagaram-lhe ordenados de 1000 euros e proletarizaram-nos.
A Ordem dos Advogados sustentou a sua pesada estrutura através de dezenas de cursos de estágio para candidatos à advocacia pagos a peso de ouro e milhares de quotas elevadas de advogados a 37 euros e meio por mês (metade desta quantia nos primeiros quatros anos de inscrição como advogado).
A Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores tornou altamente sustentável o seu sistema de segurança social à custa do pagamento das contribuições pelas fornadas dos mais jovens (que vão ter reformas muito mais baixas), em benefício dos advogados já reformados ou mais velhos.
Centenas de académicos nas áreas jurídicas, apelidados de turbo-professores, deram aulas em várias Universidades de Direito, acumularam lugares, deram apenas o nome aos programas de curso e ganharam muito dinheiro. Centenas de formadores, uns advogados com carreira feita, outros universitários, leccionaram milhares de horas de formação nos cursos de estágio da Ordem e também viram bom dinheiro.
Quem são os lesados? Todos os advogados que estão fora deste sistema – e que são a esmagadora maioria — prejudicados pela saturação do mercado, quase impedidos de exercerem individualmente a profissão e praticarem uma advocacia livre, condenados aos ditames das grandes sociedades de advogados se quiserem um emprego ou às defesas oficiosas do Estado.
O excesso de advogados foi acompanhado nos últimos anos por um processo acertado de desjudicialização de muitas matérias, que veio ao encontro dos interesses dos cidadãos mas que, objectivamente, retirou ainda mais casos aos advogados. Também por reformas no sistema de custas judiciais que tornaram o acesso à justiça incomportável para as classes médias. Ficaram sem acesso ao apoio judiciário por ultrapassarem os limites de rendimento fixados mas não conseguem pagar as taxas de justiça para interporem ou contestarem as acções. É uma escandalosa denegação do direito constitucional à justiça.
Hoje há muitos advogados praticamente sem clientes particulares que enchem o sistema de apoio judiciário do Estado, desunhando-se por casos onde ganham poucas dezenas de euros e onde começa a valer tudo, como acontece no limite dos estados de necessidade.
O mesmo Estado que desjudicializou, não refreou a fundo os numerus clausus das entradas nos cursos de Direito. A Ordem dos Advogados, mesmo com o atual bastonário Marinho Pinto, nunca foi dura o bastante para combater uma realidade de que tira proveito. E as universidades prosseguiram mercantilmente o seu negócio. Milhares de jovens continuaram, ano após ano, a escolher o curso de Direito, iludidos pelo êxito num microcosmos da advocacia mediatizado pela comunicação social. Que tardiamente perceberam que nunca podia ser o seu.
É um verdadeiro El Dorado que assenta nos super-sócios das sociedades de advogados e nos grandes escritórios que trabalham para o Estado e ganham fortunas (depois da adjudicação das grandes obras e das PPP, as novas privatizações são agora o grande negócio).
Um mundo que também assenta nos 45 deputados desta legislatura que exercem advocacia, a maioria em grandes sociedades de advogados. É a profissão que continua a ser a mais representada no hemiciclo ( 1/5 dos 230 parlamentares), misturando bem sucedidos interesses privados e públicos. E que produz com a ajuda de mais 23 deputados juristas uma torrente de legislação, por vezes confusa e contraditória, de difícil interpretação, que depois entope o sistema e dá mais trabalho… às grandes sociedades de advogados.

O CONVIDADO | O novo PGR: nem justiceiros nem cortesãos!

Diário Notícias (quarta-feira, 22 Agosto 2012)
JORGE BACELAR GOUVEIA, Professor catedrático de Direito
Nos termos constitucionais, é ao Presidente da República que cabe a decisão discricionária de escolher o novo PGR, ainda que o nome deva necessariamente recair sobre uma proposta apresentada pelo Governo.
Este é daqueles assuntos que não se resolvem com pessoas miraculosas, dotadas de superinteligência ou com plenos poderes.
Em vésperas da escolha, já circulam nomes, o que é natural, alguns promovidos por quem tem interesse, outros para serem logo “queimados”.
Julgo que a delicadeza do processo tem duas condicionantes fortíssimas, que têm atormentado a estabilidade do Ministério Público.
Por um lado, o vedetismo de alguns procuradores, que se transformaram em autênticos “atores judiciais”, multiplicando-se em intervenções mediáticas, mesmo quando os resultados do seu trabalho ficam muito aquém da grandiloquência das entrevistas dadas. Os casos de Maria José Morgado e de Cândida Almeida são disso bem um exemplo, além da sua visão justiceira e “bloquista” do Direito Penal não corresponder minimamente ao nosso modelo constitucional.
Por outro lado, a proliferação dos “procuradores cortesãos”, que bajulam a todo o momento dos titulares do poder político, não conseguindo obter a necessária distância emocional para os investigar quando for caso disso, movidos que são pela ambição de lugares.
Decerto que o Ministério Público é muito mais do que o PGR e bem merece mais do que o ainda PGR: tenho para mim que ganharia muito em conquistar alguém competente, com provas dadas no Direito, com capacidade de decisão e de liderança, mas que fosse de fora, alcançando-lhe o arejamento institucional de que neste momento precisa para se afirmar e se credibilizar.
A ver vamos como vai o PR decidir. Esta será provavelmente a sua principal decisão em matéria de justiça no tempo que lhe resta de mandato.

PGR tenta travar lei dos compromissos no Tribunal Constitucional

i (quarta-feira, 22 Agosto 2012)

Pinto Monteiro abriu mais uma guerra com o governo: a pedido dos autarcas, instruiu o Ministério Público no TC para suscitar a inconstitucionalidade da lei que pretende impedir os serviços públicos de contraírem dividas que não possam pagar
Tribunal Constitucional vai analisar lei dos compromissos
A pedido dos autarcas, o procurador-geral da República pediu ao TC que verifique a constitucionalidade da lei
LILIANA VALENTE liliana. valente@ionline.pt
A Associação Nacional de Municípios (ANMP) pediu e o Procurador-Geral da República vai dar seguimento – a polémica lei dos compromissos vai mesmo para o Tribunal Constitucional.
Para os autarcas, a Lei dos Compromissos e Pagamentos em Atraso (LCPA) diplomaque impede as entidades públicas de assumirem despesas para as quais não tenham receita prevista nos três meses seguintes – tem pontos inconstitucionais. A ANMP apresentou-os à Procuradoria, que decidiu levantar a dúvida junto do Tribunal Constitucional.
No mês de Julho, a associação pediu a Pinto Monteiro que analisasse a legislação. Na resposta, a que o i teve acesso, a Procuradoria-Geral da República faz saber aos autarcas que Pinto Monteiro assinou um despacho em que solicitou “ao senhor Procurador-geral adjunto, representante do Procurador-Geral da República no Tribunal Constitucional, que seja suscitada a questão da inconstitucionalidade da regulamentação da Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso.”
Em causa está um ponto específico da Lei dos Compromissos, um diploma que mereceu uma forte contestação dos municípios. Os autarcas consideram que a definição do conceito de “dirigente” viola a Constituição.
Na lei aprovada, os dirigentes são “aqueles que se encontram investidos em cargos políticos, em cargos de direcção superior de 1º e 2° grau, ou equiparados a para quaisquer efeitos, bem como os membros do órgão de direcção dos institutos públicos”. Uma definição que não agrada aos presidentes de câmara: “Nós somos eleitos políticos, não somos gerentes municipais. Não somos funcionários da administração pública”, explica ao i o vice-presidente da ANMP António José Ganhão. Os autarcas pedem assim que se analise não uma norma específica, mas um conceito-base da lei – que, se for considerado inconstitucional pode pôr em causa, essencialmente, o apuramento de responsabilidades por violação da legislação. No decreto regulamentar publicado em Junho, pode aferir-se a importância da definição agora contestada: “Através do presente diploma esclarecem-se alguns dos conceitos previstos da LCPA, nomeadamente os conceitos de dirigente, gestor e responsável pela contabilidade, os quais se revelam de enorme importância na delimitação de responsabilidade quando se verifique a violação” da lei. Os autarcas pretendem afectar com esta acção uma lei da qual discordam desde o início. Para os presidentes de câmara, o pedido de inconstitucionalidade pelo alargamento do conceito de dirigente a titulares de cargos políticos “tem como pano de fundo o problema da violação da autonomia”, diz Ganhão. As autarquias foram desde o início o grande problema para a entrada em vigor da lei – a negociação do decreto regulamentar que aplicava a lei às câmaras demorou meses. Os autarcas defenderam sempre que a lei violava a autonomia de cada município. “A lei dos compromissos põe em causa a autonomia. Não somos uma extensão da administração central, somos um poder autónomo”, lembra o dirigente da ANMP. O autarca diz, no entanto, que a associação “está de acordo com o rigor e com a necessidade de controlar a despesa pública”.
A notícia da decisão de Pinto Monteiro tem data do final do mês passado. Ontem, a ANMP enviou aos seus associados a notícia de que a PGR iria dar sequência à solicitação dos autarcas junto do TC. O pedido do Procurador é para uma fiscalização sucessiva da legislação, uma vez que esta já está em vigor. Além disso, a possibilidade de pedir a fiscalização preventiva (que evita que a lei entre em vigor) não está ao alcance de Pinto Monteiro. O i questionou o gabinete do PGR, mas até à hora de fecho da edição não foi possível obter um esclarecimento.
As mudanças nas câmaras em 2012
LEI DOS COMPROMISSOS
A aplicação da lei dos compromissos às câmaras demorou meses. Os presidentes de câmara diziam que a lei ia paralisar o país e pôr em causa serviços como o transporte escolar. A lei é uma exigência da troika para o controlo das dívidas em atraso da administração pública. No caso das autarquias, o governo disponibilizou primeiro uma linha de crédito de mil milhões de euros para amortizar as facturas em atraso a fornecedores, ainda à espera de ser promulgada pelo Presidente da República. Mas as câmaras que recorram a esta linha têm de aumentar os impostos municipais para a taxa máxima definida por lei.
EXTINÇÃO DAS FREGUESIAS
A reforma administrativa foi das principais reformas anunciadas pelo governo, mas tem sido de difícil implementação. Apesar de a lei já estar em vigor, várias têm sido as assembleias municipais a recusar-se a colaborar, propondo a realização de referendos locais, atrasando assim os processos. Miguel Relvas prometeu um novo mapa autárquico a tempo das eleições de 2013.
EMPRESAS MUNICIPAIS
À espera de promulgação está ainda o diploma que pretende reduzir o número de empresas municipais. Além deste diploma, Cavaco tem em cima da mesa a lei que reduz o número de dirigentes municipais.
LEI DAS FINANÇAS LOCAIS
Até ao final do ano, o governo vai apresentar uma proposta para rever a Lei das Finanças Locais, mais uma medida exigida pela troika.
LEI ELEITORAL AUTÁRQUICA
PSD e CDS anunciam até 3 de Setembro se há acordo sobre um projecto de lei conjunto para alterar a Lei Eleitoral Autárquica. Depois disso, têm ainda de chegar a um entendimento com o PS.
Tolerância zero de Pinto Monteiro para o governo
Relações entre Procurador e executivo não têm sido pacíficas
Desde que o executivo de Passos Coelho tomou posse, Pinto Monteiro mostrou já por diversas vezes o seu lado mais rigoroso. Quando há poucos meses Helena Roseta acusou Miguel Relvas de há dez anos – quando esta era bastonária da Ordem dos Arquitectos – lhe ter sugerido a contratação da empresa onde Passos trabalhava, a Procuradoria-Geral da República não hesitou: “A ser recebida participação de ilícitos criminais [contra Relvas], a questão será ponderada”.
Um interesse que foi manifestado também nos últimos dias no caso do desaparecimento de documentos do caso dos submarinos. Pinto Monteiro revelou estar interessado em descobrir o paradeiro desses documentos. Ao i o PGR disse mesmo que assim que regressasse de férias – algo que aconteceu esta semana – iria ordenar que o Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) voltasse “a insistir com o ministério da Defesa no sentido de informar onde estão os documentos em falta.” Uma posição que surge na mesma altura em que Paulo Portas – actual responsável pela pasta dos Negócios Estrangeiros e ex-ministro da Defesa – disse em público que não acreditava que faltassem documentos.
Mas já há muito que se conhecem estes desentendimentos. No final do ano passado foi o bastonário da Ordem dos advogados a acusar o executivo de Passos Coelho, nomeadamente a ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, de ter tentado destituir Pinto Monteiro antes do termo do seu mandato de seis anos. Marinho e Pinto adiantou ainda que quem impediu esse acto de “chicana” e de “quase humilhação pública” do PGR foi o Presidente da República.
Um episódio que mostra como a tolerância zero de Pinto Monteiro é retribuída pelos membros do actual governo.
Carlos Diogo Santos

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Mapa judiciário, racionalidade e bom senso

Diabo (terça-feira, 21 Agosto 2012)
SANTANA MAIA LEONARDO
Se a posição daqueles que são contra o fecho de tribunais faz lembrar os professores que, pura e simplesmente, recusavam qualquer avaliação, a actual ministra da Justiça só faz lembrar a voluntariosa Maria de Lurdes Rodrigues que queria impor um modelo de avaliação dos professores que não tinha pés nem cabeça. Com efeito, a reforma do mapa judiciário, tal como foi apresentada pelo Governo, também não é defensável do ponto de vista da racionalidade económica como, aliás, qualquer pessoa com um mínimo de senso não pode deixar de constatar.
E mais uma vez fica patente nesta proposta governamental as quatro principais razões porque os nossos governantes estão mais vocacionados para destruir do que para construir o que quer que seja. RAZÃO N°1: os nossos governantes governam, literalmente, como se Portugal fosse apenas a faixa litoral Lisboa-Porto delimitada pela Al. O desconhecimento revelado do resto do território em cada proposta que apresentam é confrangedor. RAZÃO N°2: os nossos governantes não conseguem perceber que são mais importantes os homens que aplicam as leis do que as leis que eles aplicam. E, como tal, agem como o empresário agrícola que, vendo a sua propriedade mal lavrada, muda todos os anos de tractor, sem perceber que o problema é do tractorista. E, como o problema é do tractorista, de cada vez que muda de tractor a situação ainda se agrava mais, como é óbvio. RAZÃO N°3: as instituições e as leis são como as plantas que transplantadas para regiões com climas diferentes estiolam e não produzem os mesmos resultados. RAZÃO N°4: os nossos governantes confundem reformista com revolucionário e, consequentemente, em vez de proporem reformas, levam a cabo revoluções. E as revoluções são empurrões dados ao povo que, em vez de o fazer correr, fazem-no cair… O pior depois é levantá-lo do chão.
Ora, não adianta agora discutir se a reforma do mapa judiciário deve ter por base os distritos ou os círculos judiciais, porque a verdade é que foi precisamente o Governo de Portugal que assentou a organização judiciaria no círculo judicial. Logo, qualquer reforma do mapa judiciário, com um mínimo de racionalidade e sensatez, tem de partir necessariamente do círculo judicial até porque toda a gente organizou a sua vida nessa base. Caso contrário, é impossível contar com o empenho, a dedicação e a boa vontade dos operadores judiciários, factores absolutamente essenciais para que qualquer reforma, por muito boa que seja, consiga vingar.
Mas a irracionalidade económica da proposta do Governo não se fica por aqui. Com efeito, qualquer reforma do mapa judiciário para ser racional do ponto de vista económico não pode funcionar como um acelerador da desertificação do território, que é hoje um dos principais dramas com que se debate o nosso país. Portugal é hoje uma avião prestes a despenhar-se no mar porque já só tem a funcionar o motor da asa esquerda.
Senão vejamos: a distância entre Santarém e Aveiro é, sensivelmente, a mesma que entre Santarém e Portalegre. Entre Santarém e Portalegre, só havia um círculo judicial e um Tribunal do Trabalho: Abrantes, que desaparece do novo mapa judiciário. Por sua vez, entre Santarém e Aveiro, o novo mapa judiciário apresenta dez tribunais com competências reforçadas: Caldas da Rainha, Alcobaça, Tomar, Leiria, Pombal, Figueira da Foz, Coimbra, Águeda, Oliveira do Bairro e Aveiro. Sem esquecer que Santarém tem a sul, a cerca de 50 km, Vila Franca de Xira que, recorde-se, dista apenas 20 minutos o novo Campus da Justiça.
Como facilmente se constata, o novo mapa judiciário só vai acentuar o já íngreme declive do nosso território em direcção ao litoral e afirmar, definitivamente, a auto-estrada A1 como a verdadeira fronteira de Portugal. Mas se o Governo considera que Portugal termina na Al, então deve avançar com a grande reforma estrutural que se impõe: a concessão da independência às regiões de Portugal que ficam para além da faixa litoral Lisboa-Porto delimitada pela Al.

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

A grande surpresa do próximo Orçamento

Diário Económico (segunda-feira, 20 Agosto 2012)
O Governo terá de encontrar uma solução para contornar o veto ao corte dos subsídios.
Márcia Galrão
Uma das novidades mais aguardadas para o Orçamento de Estado para 2013 (OE/13) será a solução encontrada pelo Governo para compensar o veto do Tribunal Constitucional (TC) ao corte dos subsídios de férias e de Natal dos funcionários públicos e pensionistas. Passos Coelho e Vítor Gaspar já têm soluções em cima da mesa para compensar a perda de mais dois mil milhões de euros de poupança na despesa do Estado em 2013 para cumprir a meta de 3% do défice.
O Diário Económico sabe que a solução passará por um conjunto de medidas a aplicar em várias vertentes e não apenas por uma sobretaxa a aplicar também ao privado. Assim, todos os ministérios sofrerão cortes significativos no seu orçamento para o próximo ano, nomeadamente alguns que têm sido mais poupados, como a Administração Interna, e serão tributados, também, rendimentos de capital. Por decidir está ainda a aplicação, ou não, de novas medidas de austeridade do lado da receita. Pedro Passos Coelho não esclareceu esta questão na festa do Pontal na semana passada, mas o parceiro de coligação já deixou claro que não validará novo aumento de impostos.
O primeiro-ministro pediu o apoio do PS para encontrar soluções alternativas ao corte dos subsídios, mas Seguro fez saber que se recusa a ser coautor do Orçamento. Os socialistas entendem que tem de ser o Governo a encontrar soluções e só depois de conhecido o documento é que o PS proporá alternativas.
A liderança de Seguro considera que o caminho que está a ser seguido é errado e tem dito que para este Orçamento não valerá o argumento do consenso político subjacente ao memorando da ‘troika’. Embora o PS tenha reafirmado que o sentido de voto ao OE/13 só será definido depois de conhecido o documento, a hipótese de chumbo é cada vez mais falada entre os socialistas.
Para já, o único ponto já conhecido do documento que Vítor Gaspar terá de apresentar no Parlamento até 15 de Outubro, é o corte acima de 2,7% nas transferências para as universidades. O ministro das Finanças também já disse que no âmbito da preparação do OE/13 irá estudar o corte da Taxa Social Únicapara segmentos específicos, com um impacto limitado nas contas do Estado. ¦ com I.D.B.
CORTE NOS SUBSÍDIOS
2015 milhões
No próximo ano o Governo terá de encontrar uma alternativa para arrecadar 2015 milhões de euros, o equivalente ao corte nos subsídios de férias e de Natal dos funcionários públicos e pensionistas.

domingo, 19 de agosto de 2012

Crime no elevador

Por: Fernanda Palma, Professora Catedrática de Direito Penal
O triplo homicídio de Queluz patenteia uma violência crescente na sociedade portuguesa, que as estatísticas recentes têm comprovado. Devido a um conflito familiar, resultante de uma partilha de bens, um homem encarcerou a cunhada e a sobrinha, acompanhadas de "guarda-costas", no elevador de um prédio residencial, regou-o com combustível e ateou-lhe fogo.
O homem já tinha ameaçado as vítimas. Porém, depois de se entregar voluntariamente, procurou desculpar o seu tresloucado ato afirmando que apenas as quisera assustar. O problema jurídico que se coloca é saber se esta pretensa intenção de assustar as vítimas, que morreram carbonizadas, afasta o dolo de homicídio e atenua a responsabilidade penal do arguido.
Na verdade, existem vários exemplos históricos de situações em que o agente não tem nenhum desejo ou mesmo interesse na morte da vítima. Assim, no célebre caso dos mendigos que estropiavam crianças para melhor explorarem a caridade alheia, a morte de algumas das crianças não era desejada ou útil. Porém, era um efeito colateral da sua "indústria criminosa".
A lei e a doutrina penais não fazem depender a existência de dolo de homicídio – ou seja, do chamado homicídio voluntário – de desejos, crenças ou superstições. Atua com dolo quem sabe que irá, fatalmente, matar alguém, mesmo que não o "deseje". E age ainda com dolo (eventual) quem prevê a possibilidade de a vítima morrer e se conforma com ela.
A punição do homicídio doloso – com prisão até 25 anos nos casos mais graves – pressupõe a decisão de aceitar ou se conformar com a morte da vítima, em face de atos cujo significado não é escolhido livremente. Tal como um músico que segue a partitura, atribuímos aos nossos atos e às suas conexões causais o sentido que aprendemos a dar-lhes desde crianças.
Quem, estando consciente, põe em movimento meios tão perigosos, agindo cego quanto às consequências, não pode invocar, contra o pensamento de todos os outros e o seu próprio entendimento racional, que não previu ou desejou o desfecho fatal. Ao tribunal competirá apreciar o estado mental e as motivações do arguido para graduar a sua responsabilidade.
Seja como for, o caso do elevador deve servir como (mais um) alerta sobre o estado da sociedade portuguesa. Num contexto de ausência de cimento social e de valores humanos, tem crescido o número de homicídios. A resposta do sistema penal, com condenações justas e eficazes, é indispensável, mas tem de ser precedida de medidas sociais preventivas.

sábado, 18 de agosto de 2012

Testemunhas quase nunca pedem compensação por irem a tribunal

Ordem dos Médicos diz ter registo de várias queixas de clínicos que são chamados a depor e acabam por não ser ouvidos, perdendo dias inteiros de trabalho. Mas quase ninguém sabe que tem direito a ser ressarcido
Justiça
Mariana Oliveira
A grande maioria das testemunhas chamadas a prestar depoimento em tribunal não pede qualquer compensação pelas despesas gastas nas deslocações, apesar de a lei prever essa possibilidade mesmo quando as pessoas não chegam a ser ouvidas. O Ministério da Justiça não disponibilizou dados em tempo útil, mas a conclusão é consensual entre os funcionários judiciais. Muitas desconhecem que têm esse direito e outras inibem-se de exercê-lo porque o encargo é imputado à parte que os indica, explica o presidente do Sindicato dos Oficiais de Justiça (SOJ), Carlos Almeida.
Foi a falta de informação que levou recentemente a Ordem dos Médicos a alertar os profissionais da classe para a existência dessa compensação e a disponibilizar uma minuta que pode ser usada pelos clínicos para requerer o pagamento. “Muitos médicos são chamados a colaborar com a justiça na qualidade de testemunhas e queixam-se, com frequência, de passarem horas infindáveis ou mesmo dias à espera de serem ouvidos sem que ‘alguém’ lhes pague o tempo despendido ou sequer as despesas com transporte e portagens”, escreve a Ordem numa nota. O pagamento só pode ser feito se o depoente apresentar um pedido formal no tribunal, que deve ser acompanhado pelas facturas respectivas. O requerimento tem que ser entregue até à última sessão do julgamento.
20 cêntimos por km
O Regulamento das Custas Processuais prevê que sejam pagos 20,4 cêntimos por cada quilómetro feito nas deslocações ao tribunal, mas existe ainda a possibilidade de a testemunha pedir o que a lei designa por “indemnização equitativa”. Essa compensação pode abranger gastos com portagens e até remunerações ou regalias perdidas com as faltas ao trabalho, mas cabe aos juízes determinar as parcelas elegíveis e definir o montante a pagar.
“Nem sequer 5% das testemunhas apresentam qualquer nota de despesas”, diz Carlos Almeida. Umas por desconhecimento, outras por uma questão cultural. “Apesar de não ser necessário, em Portugal pergunta-se quase sempre às pessoas se estão disponíveis para testemunhar e estas, ao aceitarem, sentem-se sem direito de apresentar despesas”, afirma o sindicalista. Teresa Rodrigues, outra dirigente do SOJ, subscreve: “Muitas vezes as testemunhas são conhecidas e amigas das partes e não querem causar-lhes esse incómodo”.
Antigamente, o Instituto de Gestão Financeira e de Infra-Estruturas da Justiça adiantava as verbas, mas hoje isso só acontece quando a parte a quem é imputada a despesa beneficia de apoio judiciário ou está isenta de custas. Nos outros casos, a testemunha só recebe quando o responsável por compensá-la pagar. Apesar de o processo ter de passar pelo crivo de um juiz, a testemunha pode pedir o dinheiro directamente à parte. Mas, normalmente, é o tribunal que notifica a parte para pagar. Se esta não o fizer, a despesa pode ser incluída na conta final do processo, sendo paga por quem ficar responsável pelas custas. Neste caso, contudo, o pagamento pode demorar anos, já que a decisão tem que se tornar definitiva, sem hipótese de qualquer recurso. Mais do que a compensação das despesas, o bastonário dos médicos, José Manuel Silva, preocupa-se com os adiamentos constantes que obrigam os clínicos a repetir a ida ao tribunal, tendo por vezes que adiar cirurgias e consultas. “São milhares de horas de trabalho deitadas ao lixo. Isso deve corresponder a muitos feriados e a muitos milhões de euros perdidos”, sublinha. José Manuel Silva lamenta que os tribunais convoquem todas as testemunhas para a mesma sessão, quando se sabe que é impossível ouvi-las todas, e apela a uma gestão mais cuidada da convocação das testemunhas.

Audiências com menos cancelamentos
Princípio consta da reforma do Processo Civil
O anteprojecto de revisão do Código de Processo Civil consagra o princípio da inadiabilidade da audiência final, que não deve deixar de se realizar salvo se houver impedimento do tribunal, faltar algum advogado em determinadas circunstâncias ou ocorrer motivo que constitua justo impedimento. Apesar das excepções, na exposição da reforma lê-se que “é praticamente seguro que a audiência agendada se realizará efectivamente, evitando a frustração das deslocações dos advogados, das partes e testemunhas à sede do tribunal e permitindo uma gestão racional e segura da agenda por parte do juiz e do advogado, que podem estar seguros de que as diligências agendadas com toda a probabilidade se irão realizar”. Para tal será importante a criação da audiência preliminar, realizada com todas as partes antes do julgamento, onde será feita a programação da audiência final, estabelecendo-se o número de sessões e as respectivas datas. M.O.

Público - sábado, 18 Agosto 2012

DIAP e Instrução juntos e dimensionados à escala do novo mapa judiciário

O Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) e o Tribunal Instrução Criminal (TIC) do Porto vão funcionar num único edifício, em instalações a arrendar e já ajustadas às necessidades determinadas pelo novo mapa judiciário, disse hoje fonte ministerial.

"Logo que termine a avaliação das áreas necessárias e da respetiva adaptação ao imóvel, serão iniciados os procedimentos tendentes ao arrendamento, designadamente o relativo à obtenção de autorização por parte do Ministério da Finanças", explicou a fonte, sem precisar em que imóvel concreto se pretende reinstalar os serviços.
O DIAP do Porto tem nove secções, que se repartem por vários edifícios da cidade, alguns com problemas de segurança, segundo o anterior procurador-geral distrital do Porto, Pinto Nogueira.
Por sua vez, o TIC funciona num imóvel antigo e de difícil acesso na zona histórica da cidade.
Juntar o DIAP e a Instrução Criminal do Porto num único edifício contribuirá para "otimizar a funcionalidade dos serviços e a operacionalidade da investigação criminal", sublinhou a fonte ministerial.
Com a introdução do novo mapa judiciário, o DIAP e o TIC (que passará a designar-se Secção de Instrução Criminal) terão desdobramentos em Matosinhos e Vila Nova de Gaia, aliviando assim o trabalho atualmente efetuado no Porto.
Ainda de acordo com a fonte, mantêm-se os planos ministeriais para transferir o Tribunal de Execução de Penas (TEP) do Largo Alberto Pimentel, onde ocupa um edifício arrendado e muito degradado, para o imóvel do Tribunal de Pequena Instância Criminal, na rua de João das Regras.
O Ministério "tomou a decisão de reinstalar o TEP no edifício sito na rua João das Regras, propriedade do Estado, "encontrando--se as obras de adaptação do edifício já adjudicadas e aprovada a respetiva minuta do contrato", explicou o gabinete de Paula Teixeira da Cruz.
A conclusão da empreitada e sequente transferência do TEP "ocorrerão até final do presente ano", garantiu.
Os serviços judiciais do Porto encontram-se repartidos por diversos edifícios, tendo abortado uma parceria público-privada, que chegou a ser formalmente anunciada, para dotar a cidade com um `campus` da Justiça similar ao de Lisboa.