Joana Marques Vidal: como foi escolhida a
primeira mulher PGR
Justiça. O nome foi sugerido pela
ministra da Justiça e Cavaco Silva aceitou. A nova PGR, a primeira mulher no
cargo, vem de uma família ligada ao sector e gera consensos.
Joana,
a nova comandante do combate ao crime em Portugal
Nomeação. Presidente da República
escolheu a magistrada Joana Marques Vidal, 57 anos, para substituir Pinto
Monteiro à frente da Procuradoria-Geral da República
A principal cadeira da Procuradoria-Geral da República vai ser
ocupada pela primeira vez por uma mulher. Joana Marques Vidal, 57 anos,
magistrada do Ministério Público (MP) desde 1979, foi a personalidade de
consenso entre Presidente da República e Governo para substituir Fernando Pinto
Monteiro, que hoje termina o mandato de seis anos. Ao que o DN apurou, o nome
foi sugerido pela ministrada Justiça, Paula Teixeira da Cruz, na primeira lista
posta à consideração do Governo. A tornada de posse está marcada para dia 12.
“É um nome que eu escolheria”, disse ao DN João Correia, ex-membro do Conselho
Superior do Ministério Público, personalidade que surgia também entre os
potenciais candidatos. “Digo-o com sinceridade”, sublinhou o ex-secretário de
Estado da Justiça, dizendo-se confiante em que a procuradora vai ter êxito nas
suas novas responsabilidades. Tratou-se, de facto, de uma escolha que caiu bem
em todos os sectores judiciários, também por ser uma mulher, mas sobretudo pelo
facto de se tratar de uma magistratura que é conhecida
pela sua independência e ponderação perante os diversos poderes – internos e
externos. “É uma pessoa amorosa”, acrescentaram as fontes do DN, recordando que
um dos critérios para o lugar, apontados pela ministra, seria o de “alguém que
ame o Ministério Público”.
Joana Marques Vidal, “Joaninha” nos meandros do judiciário, é
apontada como alguém que não só conhece bem o MP como tem, igualmente, o
reconhecimento dos seus pares, sobretudo do Sindicato dos Magistrados do
Ministério Público (SMMP). Aliás, por parte do sindicato havia a indicação de
que o próximo PGR teria de ser alguém que se sentisse identificado com aquela
magistratura e a soubesse dignificar. As críticas do anterior presidente, João
Palma, e do atual, Rui Cardoso, foram sempre no sentido de que o “consulado” de
Pinto Monteiro foram anos de “desencontros” entre os magistrados do MP e o PGR.
Exigia-se, assim, que o próximo “inquilino” do palácio da Palmela fosse alguém
que reconcilie o MP com a Procuradoria-Geral da República
Acrescem às características pessoais da magistrada a facilidade
que demonstra no diálogo com a sociedade civil. Atualmente é a presidente da
Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) e vice-presidente da direção da
Associação Portuguesa para o Direito dos Menores e da Família – Crescer Ser.
Mas, na magistratura, o nome Marques Vidal não é de todo desconhecido. O pai,
José, foi vice-procurador-geral da República ao tempo de Arala Chaves (falecido), e diretor
nacional da Polícia Judiciária ao tempo em que Cavaco Silva era chefe do
Governo. O juiz conselheiro, jubilado, mostrou-se surpreendido. “Está a dar-me
uma novidade”, disse ao DN. “É evidente que não posso fazer comentário nenhum.
Os meus filhos foram sempre muito independentes, como lhes ensinei a ser desde
pequeninos. A única coisa que posso dizer é que tenho seis filhos e gosto muito
de todos eles”, acrescentou. Um seu outro filho, João, foi o procurador que
investigou o processo “Face Oculta”, tendo partido dele a iniciativa da investigação
que culminou com a destruição das escutas a José Sócrates.
Não bastará a Joana Marques Vidal ser simpática, competente,
independente relativamente à ”capelinhas” do MP. Terá também de ter consigo uma
equipa forte, capaz de “dar os murros na mesa”, que terá faltado no mandato que
acaba.
Proposta
pela direita mas com visão de esquerda
Bastidores Conhecido como uma humanista
de política de esquerda, o nome de Joana Marques Vidal foi de difícil consenso
entre Presidente e coligação governamental de direita
Joana
Marques Vidal tem um perfil pessoal e profissional que agrada à ministra da Justiça.
Por isso, o seu nome foi proposto ao Governo por Paula Teixeira da Cruz para
que constasse da lista a apresentar ao Presidente da República, a quem cabe
nomear o procurador-geral da República (PGR). Mas o facto de a magistrada se
mostrar com uma sensibilidade politicamente de esquerda colocou entraves que só
foram superados pela necessidade de apaziguamento do Ministério Público (MP),
exacerbada pelo mandato de Pinto Monteiro.
Conforme noticiou o DN no dia 2, a presidência da República
chegou a ponderar outros nomes para além dos propostos pelo Governo. A
hesitação levou, inclusive, a que Cavaco Silva tivesse pedido um parecer sobre
as consequências do atraso na nomeação. Mas, pesados os prós e contras,
concluiu-se que o nome de Joana Marques Vidal, embora, com uma sensibilidade de
esquerda, sem nunca ter pertencido a qualquer partido político, era a
personalidade que mais consensos gerava entre os partidos com assento
parlamentar. Um dos argumentos foi que o próximo PGR, com um mandato de seis
anos, terá de trabalhar com um novo Governo, e com um novo Presidente da
República, admitindo-se a hipótese de virem a ser de cores partidárias
diferentes das dos atuais.
O Presidente da República foi também pressionado pelo Sindicato
dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) no sentido de que o atraso na
nomeação, tal como o DN noticiou, poderia ser interpretado como uma menorização
daquela magistratura. E estando o Ministério Público (MP) fragilizado, como
nunca esteve, Cavaco Silva avançou com a nomeação, e com um nome que, da
esquerda à direita, e entre os operadores judiciários, era consensual.
Joana Marques Vidal, 57 anos, solteira, é a mais velha de seis
irmãos, filhos do juiz conselheiro José Marques Vidal. Formada em Direito pela
Universidade Clássica de Lisboa, em 1978, é uma magistrada que acredita em
causas. Por isso, aceitou presidir à Associação Portuguesa de Apoio àVítima
(APAV), cujo mandato terminaria em dezembro, e se apresenta, sempre, como
alguém interessada por políticas da família.
Sendo magistrada do MP desde 1979, esta procuradora-geral
adjunta foi coordenadora dos magistrados do MP do Tribunal de Família e Menores
de Lisboa, de 1994 a 2002. Exerceu também funções de docente na área de Família
e Menores no Centro de Estudos Judiciários, durante três anos, e, entre outubro
de 2002 e outubro de 2004, desempenhou funções de diretora adjunta do Centro de
Estudos Judiciários, quando era diretor Mário Mendes.
Participou ainda em diversas comissões legislativas no âmbito do
Direito da Família e dos Menores, destacando-se a participação como membro da
comissão legislativa para a redação da Lei Tutelar Educativa e como membro da
comissão que procedeu às últimas alterações da Legislação da Adoção. Faltará
algum experiência no combate ao crime, sobretudo económico, e, por isso, a
magistrada terá de constituir uma equipa que preencha as suas lacunas.
A
herança deixada por Fernando Pinto Monteiro
MINISTÉRIO público Depois de seis anos de Pinto Monteiro, Joana
Marques Vidal vai encontrar um Ministério Público desanimado, desmotivado, à
procura de um líder forte. À espera da nova procuradora-geral da República
estão ainda vários dossiês quentes
Processos
em fase de ebulição
São vários os casos que podem trazer dores de cabeça à futura
procuradora-geral da República: a investigação às parcerias público-privadas,
os submarinos, a privatização da EDP, o BPP, a operação Monte Branco e ainda os
“filhos” do processo principal do BPN, como o caso de Dias Loureiro. As mais
que prováveis polémicas à volta destes processos serão um teste à capacidade de
Joana Marques Vidal em liderar o Ministério Público e saber conviver com as
“pressões” do cargo de PGR.
Organização
e gestão interna
Perante um escrutínio cada vez maior da atividade do Ministério
Público, Joana Marques Vidal terá pela frente um importante desafio: organizar
internamente a estrutura de forma a dar resposta atempada às solicitações e às
polémicas que surgem. Por outro lado, no caso dos chamados megaprocessos, a
nova procuradora-geral terá de decidir se continuam a ser investigados a um
ritmo normal ou se o Ministério Público deve concentrar meios para acelerar a
sua resolução.
Motivação
dos procuradores
Fernando Pinto Monteiro não foi propriamente um exemplo de
motivação interna para os procuradores do MP. Basta recordar a série de
processos disciplinares que abriu a procuradores do DCIAP, organismo que
depende diretamente da Procuradoria-Geral da República. Os próximos tempos
anunciam-se complicados, com a perspetiva de uma aumento da criminalidade, como
as falências fraudulentas. Como é que a nova PGR vai motivar os seus
procuradores?
“Não
fico na Procuradoria nem mais um minuto”
Despedida
Fernando Pinto Monteiro chega ao fim do um mandato de seis anos na
Procuradoria-Geral da República O juiz conselheiro vai agora usufruir do seu
estatuto de magistrado jubilado, ao qual tem direito desde abril, quando
completou 70 anos. Foi um fim de carreira na magistratura marcante. Por duas
vezes concorreu a presidente do Supremo Tribunal de Justiça, para onde entrou em
1998, sem nunca ter sido opção dos seus colegas conselheiros. Mas em 2006 foi a
escolha apontada pelo então primeiro ministro José Sócrates, tendo sido
aplaudido pelos vários sectores do judiciário. Mas depressa entrou em confronto
com os magistrados do Ministério Público e o seu mandato acabou por ser
atribulado. Sai sob uma chuva de criticas, mas o mesmo aconteceu aos seus
antecessores, pelas mais variadas razões.
Candidatos
dizem adeus à última oportunidade
ESCOLHAS
Com a nomeação de Joana Marques Vidal, ontem anunciada pela Presidência da
República, várias personalidades vêem fugir a oportunidade de um dia assumirem
o cargo de procurador-geral da República. Um dos nomes que ficará para a
história com “eterno” candidato será o de Henrique Gaspar. O juiz conselheiro
era há seis anos um dos nomes preferidos de Cavaco Silva. Também agora o era.
Mas não foi o escolhido. Pelo caminho ficou também Euclides Dâmaso, o
procurador-geral distrital de Coimbra. Era um nome forte, querido pelos órgãos
de polícia criminal, incluindo pela Polícia Judiciária. Mas Cavaco Silva, em
vez de um “duro”, optou antes pela sensibilidade. Pelo caminho ficou ainda
Cândida Almeida, outra mulher aventada para o cargo, que deverá também
abandonar o Departamento Central de Investigação e Ação Penal.
Mulheres na
justiça
A
segunda figura do Estado em Portugal é uma mulher:
Assunção Esteves, presidente na AR. Na Justiça o género feminino
domina: da ministra a várias direções do MP. São 59% dos procuradores e 55% dos
juizes.
PAULA TEIXEIRA DA CRUZ
MINISTRA DA JUSTIÇA
Militante do PSD desde 1995 e advogada desde 1992, foi vereadora
da Câmara de Lisboa. Subiu a vice-presidente da Comissão Política do PSD com
Passos Coelho, em 2010.
MARIA
LÚCIA AMARAL VICE-PRESIDENTE DO TC
Juíza do Tribunal Constitucional desde 2007, foi eleita sua
vice-presidente na semana passada, a dois de outubro. É docente da Faculdade de
Direito de Lisboa.
CÂNDIDA
ALMEIDA DIRETORA DCIAP
A diretora da Direção Central de Investigação e Ação Penal
(DCIAP) foi um dos nomes falados para PGR. Foi a primeira mulher a entrar no
Ministério Público, em 1976.
FRANCISCA
VAN DUNEM PGD-LISBOA
A procuradora-geral distrital de Lisboa assumiu o posto em 2007
e tem sabido merecer o respeito do MP e das polícias. Era uma possível escolha
para substituir Pinto Monteiro.
MARIA
RAQUEL FERREIRA PGD-PORTO
A seguir o exemplo de Lisboa, o Porto tem também, desde junho,
uma mulher a dirigir a procuradoria-geral distrital. Na tomada de posse pediu
“energia” aos procuradores.
MARIA
JOSÉ MORGADO DIAP LISBOA
Titular de vários casos mediáticos, como o Apito Dourado’ e
militante anti-corrupção, dirige o Departamento de Investigação e Ação Penal
(DIAP) desde 2007.
MARIA
DO CÉU SOUSA DIAP PORTO
A procuradora-geral adjunta do Tribunal da Relação do Porto foi
nomeada em 2008, por Pinto Monteiro, para dirigir o DIAP daquele distrito.
CÂNDIDA
VILAR UNID. DE COMBATE CRIME VIOLENTO
É também uma mulher, Cândida Vilar, que está a liderar a Unidade
de Combate ao Crime especialmente Violento, do DIAP de Lisboa.
Extremamente
séria e de grande humanismo
O juiz-conselheiro Mário Mendes está muito “satisfeito” com a
escolha de Joana Marques Vidal, que foi sua diretora adjunta no Centro de
Estudos Judiciários. Destaca algumas qualidades da nova PGR: “Extremamente
séria, dedicada, de um grande humanismo.” O ex-diretor da PJ salienta ainda que
a procuradora tem “grande capacidade dialogante, mas [é] firme”.
Tem
a “capacidade para mudar e reorganizar”
O presidente da Associação Sindical de Juizes disse que Joana
Marques Vidal “tem capacidade para mudar e reorganizar o Ministério Público”. O
juiz Mouraz Lopes disse que a magistrada, desde 1979, “tem um conhecimento
muito profundo do MP”, salientando que lhe reconhece “capacidade”. “Tem uma
noção muito abrangente da Justiça”, sublinhou o juiz desembargador.
Diário Notícias | terça-feira, 09 Outubro 2012
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