sexta-feira, 8 de março de 2013

Generais pedem 300 mil euros de indemnização a Rafael Marques e Bárbara Bulhosa

JOANA GORJÃO HENRIQUES 
Público - 08/03/2013 - 00:00
Ministério Público diz que não acompanha a acusação particular interposta por generais alegando "liberdade de informação"
Depois de nem há um mês o Ministério Público ter concluído que não havia indícios de crime de difamação contra o jornalista angolano Rafael Marques, autor do livro Diamantes de Sangue, e contra a sua editora portuguesa Tinta da China, os oito generais e as duas empresas prosseguiram com o processo-crime deduzindo a acusação e pedindo uma indemnização de 300 mil euros a ambos.
Rafael Marques pode agora pedir a abertura de instrução do processo - o juiz avaliará se há matéria suficiente, isto é, se há indícios sérios de prática de crime que justifiquem o caso ir a julgamento. De qualquer decisão do juiz de instrução pode haver recurso.
O jornalista foi notificado pelo Departamento de Investigação e Acção Penal a 6 de Março, informando-o de que o Ministério Público não acompanhava a acusação particular por crime de difamação feita por oito generais e pelas duas empresas angolanas por entender que a publicação do livro "se enquadra no legítimo exercício de informação e de expressão".
A dedução da acusação particular é apenas contra Rafael Marques, mas o pedido de indemnização é também contra a editora: cada um dos generais angolanos, entre eles Hélder Vieira Dias "Kopelipa", ministro de Estado e chefe da casa militar da Presidência da República, e o general António dos Santos França "Ndalu", e cada uma das empresas - Sociedade Mineira do Cuango e Teleservice - Sociedade de Telecomunicações, Segurança e Serviços - pedem uma indemnização de 15 mil euros ao jornalista e à editora, ou seja, no total, são 300 mil euros. Outros generais queixosos são Armando da Cruz Neto e João de Matos, que ocuparam o cargo de chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas Angolanas.
Em causa está uma investigação feita durante anos por Rafael Marques, e publicada no livro Diamantes de Sangue: Tortura e Corrupção em Angola, sobre empresas de extracção mineira nas Lundas angolanas, onde vários generais são acusados de violação de direitos humanos. No livro publicado em 2011, Marques denuncia ainda "a promiscuidade entre poder político-militar e o negócio dos diamantes".
A 11 de Fevereiro, foi noticiado que o Ministério Público tinha arquivado a queixa por não ter encontrado indícios de difamação em Diamantes de Sangue. O MP concluiu que "a publicação do livro se enquadra no legítimo exercício de um direito fundamental, a liberdade de informação e de expressão, constitucionalmente protegido, que, no caso concreto, se sobrepõe a outros direitos".
A queixa-crime contra Rafael Marques foi apresentada no ano passado - em Novembro, Marques foi constituído arguido. Seguiu-se a notificação a Bárbara Bulhosa, em Dezembro, que em finais de Janeiro seria constituída também arguida.
Quando foi constituído arguido, Marques disse ao PÚBLICO: "Este caso em Portugal apareceu depois de uma queixa-crime que eu apresentei em Luanda, em Novembro de 2011, denunciando os generais por crimes contra a humanidade" - queixa esta que acabaria por ser arquivada pela justiça angolana. Por seu lado, depois da pronúncia do MP, Bárbara Bulhosa comentava: "Não teria publicado o livro se não me tivesse assegurado da veracidade daquilo que ele relata. Tive acesso a todos os documentos que Rafael Marques foi recolhendo ao longo dos anos para o escrever". E acrescentava: "Um editor não pode ter medo".
O advogado que representa os generais e empresas angolanas, João Medeiros, do PLMJ, confirmou em Janeiro que entre os queixosos, estava "Kopelipa". O livro tinha vendido cerca de sete mil exemplares em Portugal.

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