21/12/2012 - 00:00
Denúncias de abuso "de
incapazes" na Ordem religiosa que detém a Casa de Saúde do Telhal deram
origem a três inquéritos
A Procuradoria-Geral da República (PGR) admite que os inquéritos em curso
relacionados com suspeitas de abuso sexual em instituições da Igreja - "ou
alguns deles" - poderão vir a "ser unificados, se tal se
justificar". Numa nota emitida ontem, a PGR revelou que correm,
actualmente, três inquéritos que envolvem suspeitas na Ordem Hospitaleira de
São João de Deus, uma ordem católica que trabalha em Portugal na área da saúde
mental. A estes acresce um quarto, que foi aberto na semana passada, às
declarações da ex-provedora da Casa Pia de Lisboa, que disse ao PÚBLICO que
conhecia casos de pedofilia na Igreja.
Os três inquéritos à Ordem estão relacionados com a eventual prática de
crimes "de abuso sexual de incapazes e de pessoa internada" e de
"crimes patrimoniais e de natureza fiscal". O caso está em
"segredo de justiça". E a PGR não diz quando recebeu as denúncias.
Informa sim que estas foram remetidas ao Departamento Central de Investigação e
Acção Penal que, por sua vez, abriu os inquéritos. E que a investigação está
nas mãos da Directoria de Lisboa da Polícia Judiciária.
Os factos terão ocorrido em Sintra, onde a Ordem religiosa tem a Casa de
Saúde do Telhal (constituída por unidades de longo internamento e de
reabilitação e três clínicas especializadas de psiquiatria aguda,
psicogeriatria e alcoologia). Mas também em Montemor-o-Novo, onde é responsável
por um hospital especializado em ortopedia, que faz parte da rede nacional de
cuidados continuados. Estão ainda a ser investigados factos ocorridos em Portalegre.
Um outro inquérito correu termos nos serviços do Ministério Público de
Ponta Delgada, nos Açores, "por factos reportados" pelo próprio
Instituto São João de Deus, a instituição particular de solidariedade que gere
os oito estabelecimentos hospitalares da Ordem em Portugal. Mas foi arquivado
por insuficiência de indícios. A PGR admite que pode ser reaberto, se
"novos elementos probatórios" o justificarem.
O PÚBLICO tentou obter uma reacção de José Augusto Louro, superior
provincial da Ordem em Portugal. Mas sem sucesso. Já Vítor Cotovio, da direcção
clínica no Telhal, não quis comentar e remeteu todas as explicações para
Augusto Louro.
A mesma nota da PGR lembra que está em curso no Departamento de
Investigação e Acção Penal (DIAP) de Lisboa um inquérito que teve origem em
declarações recentes de Catalina Pestana. "Sei que há casos de pedofilia,
só na diocese de Lisboa conheço cinco", disse a ex-provedora, a 8 de
Dezembro, depois de afirmar não estar surpreendida com a detenção de um padre,
no Fundão, suspeito de abuso sexual de menores. Anteontem foi ouvida no DIAP.
"Em razão da natureza dos bens jurídicos em causa e das regras de
conexão processual", faz saber a PGR, os processos podem vir a ser
unificados. Todos têm carácter de urgência.
Em 2010, uma mensagem de correio electrónico não identificada foi enviada
para 300 endereços de e-mail e denunciava abusos sexuais, gestão danosa e abuso de poder na Ordem
Hospitaleira - que abriu, então, uma investigação interna que envolvia um
religioso de 49 anos. Há uma semana, o Expresso deu conta
que um dos doentes mentais alegadamente abusados seria menor de idade.
Este é um dos casos que a Rede de Cuidadores - associação fundada por
Catalina Pestana e pelo psiquiatra Álvaro de Carvalho - referencia como exemplo
de abusos em instituições da Igreja.
Contactado pelo PÚBLICO, o padre Lino Maia, da Confederação Nacional das
Instituições de Solidariedade, diz que o que está a ser investigado "é
extremamente grave", que estas situações o "repugnam", que
"é bom que as averiguações aconteçam" e que espera que nada se
confirme. "É muito importante que de uma vez por todas acabem estas
suspeitas. A Igreja e este Papa têm promovido uma grande campanha de
purificação que deve continuar. A Igreja, que tem uma acção tão nobre, não pode
anular o que de bom faz."
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