sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Investigações a crimes de corrupção aumentaram 80%


Relatório da PGR revela que foram abertos 530 inquéritos no ano passado, contra as 288 investigações criminais de 2010. DCIAP, que coordena crimes mais graves, abriu 530 inquéritos, contra 288 em 2010. Medidas de suspensão de operações bancárias também subiram.
As investigações à criminalidade económico-financeira e aos crimes mais graves, como o terrorismo, dispararam mais de 80% o ano passado. O mais recente relatório da Procuradoria Geral da República (PGR), referente a 2011, revela que o ano passado foram abertos 530 "novos inquéritos de grande complexidade e dimensão", contra as 288 investigações criminais instauradas no ano anterior.
Infracções económico-financeiras, burlas qualificadas ao Estado, corrupção, peculato, branqueamento de capitais, fraude fiscal e associação criminosa foram os principais crimes alvo de um inquérito.
O DCIAP, departamento dirigido pela procuradora Cândida Almeida, que tem a cargo os crimes mais complexos e os megaprocessos, justifica no relatório que a dimensão dos novos inquéritos é tal que exigiram "a realização de morosas perícias", bem como a emissão de cartas rogatórias que "retardam em anos a conclusão das investigações".
Na verdade, o facto de ter disparado o número das novas investigações aos crimes económicos não significa necessariamente que os processos terminem em acusações. Aliás, a reduzida concretização das investigações é muitas vezes uma das principais falhas apontada ao Ministério Público, que se queixa recorrentemente da falta de meios (financeiros e humanos) e da dificuldade na obtenção de provas. "São manifesta e publicamente conhecidas as deficiências e insuficiências logísticas e a insuficiência do número de magistrados e de órgãos de Polícia Criminal com que o DCIAP se tem confrontado", avisa Cândida Almeida, alegando que os magistrados do departamento têm dado "uma resposta minimamente aceitável".
O Diário Económico perguntou à PGR quantos inquéritos por corrupção em 2011 resultaram numa acusação, mas não obteve resposta até ao fecho desta edição. Os últimos dados facultados pelo DCIAP ao Diário Económico - referentes a 2010 - davam contam que dos mais de 700 processos movimentos (os 288 iniciados e os que transitaram do ano anterior) apenas 20 - ou seja, 2,7% - tinham resultado numa acusação. Mas a directora do DCIAP frisou na altura que destas 20 acusações, a esmagadora maioria são confirmadas pelo juiz em julgamento. "Hoje não há impunidade para a investigação", diz, no relatório, o PGR, Pinto Monteiro, que ontem completou o seu último dia de mandato, sendo substituído sexta-feira pela procuradora-geral adjunta Joana Marques Vidal.
O agora ex-PGR diz mesmo que "nunca" os crimes de corrupção foram tão investigados. Uma afirmação que tem sido contestada pelo próprio Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP), para quem Pinto Monteiro não fez da "prevenção e combate à corrupção um objectivo prioritário".
Medidas de prevenção às burlas financeiras aumentaram
No campo da prevenção, sobretudo do crime de branqueamento de capitais, a PGR admite que as instituições financeiras já estão mais sensibilizadas para a "análise de risco" de algumas operações. Esta maior cooperação levou a um aumento das comunicações e das averiguações, nomeadamente a casos de 'phishing' (esquema de burla financeira, com acesso ilegal a contas) ou a redes internacionais de branqueamento.
A medida de suspensão de operações bancárias - derivada daquelas comunicações e das suspeitas levantadas - mais que duplicou. Em 2010 tinham sido suspensas 28 e passaram para 48 em 2011. Não só aumentaram estes procedimentos, como, refere ainda o relatório, "o valor dos fundos envolvidos nas operações suspeitas". Há dois anos, a suspensão das operações bancárias e bloqueio de contas envolveram 25 milhões de euros e o ano passado já estiveram em causa 32 milhões de euros.
Para "melhorar" o sistema de prevenção de branqueamento de capitais, Cândida Almeida deixa algumas recomendações à ministra da Justiça e, agora, à nova PGR: "alargar os ilícitos típicos considerados precedentes do crime", de forma a abranger ganhos de actividades ilícitas como o jogo e casinos ilegais" e, ainda, a "necessidade de obrigar os bancos nacionais a revelar operações relacionadas com entidades bancárias em 'off-shore' detidas pelos bancos nacionais. O DCIAP exige ainda ter acesso a bases de dados de vários organismos públicos, nomeadamente do Sistema Integrado de Informação Criminal.
Consenso em torno da nova PGR
O clima não podia ser mais consensual. A nova PGR agrada no mundo político e também no judiciário. O nome da procuradora adjunta Joana Marques Vidal, que toma posse sexta-feira, foi bem recebido pelo Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, que nunca escondeu desejar alguém da 'casa'. Joana Marques Vidal é procuradora há 33 anos e desde sempre com mais ligações à esquerda que à direita.
A independência da magistrada tem sido, aliás, um dos pontos favoráveis mais focados a seu favor nas reacções à sua nomeação para a PGR, como a primeira mulher a comandar os destinos do Ministério Público. O PCP disse ontem esperar que Joana Marques Vidal exerça o cargo com independência e contribua para acabar "com a impunidade", sobretudo no crime económico.
Nuno Magalhães, do CDS, considerou que a procuradora tem um "currículo sólido" e que estará "à altura dos desafios". Também o SMMP considerou que Joana Marques Vidal "tem todas as capacidades para promover as mudanças necessárias" e Mouraz Lopes, da Associação Sindical dos Juizes, disse que a procuradora tem capacidade para "reorganizar" o MP.
Inês David Bastos
ionline em 10-10-2012

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